quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Professora Helena: a professora que encantou o Brasil

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

A novela "Carrossel" exibida pelo SBT no horário nobre tem aterrorizado a concorrência. Vem batendo facilmente o IBOPE de programas exibidos no mesmo horário, e tem assustado inclusive a Globo, pois a emissora vê parte da audiência do Jornal Nacional migrar para o SBT. A dupla William Bonner e Patrícia Poeta têm enfrentado um forte concorrente, uma novela infantil que é o remake de uma novela mexicana filmada na década de 1980 e exibida pelo SBT nos anos de 1991 e 1995.

A criançada está adorando. Mas também existem muitos adultos vidrados na novela, seja para seguirem seus filhos, ou porque os personagens de Carrossel conseguem exercer um fascínio sobre o público adulto. Um destes personagens é a professora Helena. Helena é professora de uma escola conhecida como Escola Mundial. Ela leciona no terceiro ano, e enfrenta uma turminha que lhe apresenta muitos desafios. Mas com muito afeto e carinho ela consegue se aproximar de seus alunos ajudando-os a superarem os seus problemas, não somente os educacionais, como também os problemas da vida pessoal.

Contrastando com o modelo de docência da professora Helena, existe de outro lado a diretora Olívia. Olívia defende uma linha de educação mais rígida, e nesta linha a disciplina é conseguida através de controle coercitivo, ou seja, através de punições ou de ameças de punições. Por um lado temos então Olívia, representante de um modelo educacional em vias de falência, ou seja, de um modelo educacional que usa a punição ou a ameaça de punição como meio para a obtenção de disciplina. De outro lado temos a professora Helena, representante de um modelo educacional que rompe com o paradigma da autoridade disciplinar, aquele paradigma ao estilo Foucaultiano, que mantém a ordem por meio da vigilância.

Foucault (2006) fala-nos do panóptico, um modelo de prisão que tem no centro uma torre. As selas da prisão ficam dispostas ao redor da torre, de modo que por meio desta a vigilância pode ser mantida com um contingente menor de funcionários. O panóptico é um dispositivo que ajuda a manter a vigilância e o controle através do uso de coerção, através do uso de ameaças de punições, punições que podem ocorrer quando menos se espera. Punições inesperadas e apresentadas em esquemas de reforçamento intermitente ajudam a criar um ambiente bastante hostil.

Foucault (2006) extrapola sua reflexão sobre o panóptico e a lógica das prisões para outras esferas, mencionando, que a cultura da vigilância se faz presente em outras instituições, inclusive nas escolas. Ela não é exclusiva das prisões e forças armadas. A vigilância é um meio para se manter o controle. Nas escolas de padrões arquitetônicos mais antigos podemos ver os traços desta cultura. É comum a existência de um palanque nas salas de aula. Neste palanque o professor mantém-se em um degrau mais alto que seus alunos. Esta é uma forma de demonstrar a posição de poder que o professor ocupa, de demonstrar que não pode existir aproximações entre ele e seus alunos, que ele é a fonte do saber, e os alunos devem receber esse saber passivamente.

A diretora Olívia é produto deste tipo de concepção educacional, ela e muitos professores que ainda usam o controle coercitivo como forma de manterem a disciplina, e mal sabem estes professores que coerção gera comportamentos emocionais que interferem na aprendizagem. Pobres coitados, precisam rever seus conceitos. Já a professora Helena é a legítima representante de um modelo educacional que rompe com a distância estabelecida entre professores e alunos.

Helena estabelece com seus alunos relações bastante reforçadoras. Ela traz para estas relações o componente da afetividade, componente banido pelo paradigma educacional que defende o uso da coerção como meio para a obtenção de disciplina. Quem disse que não pode existir afeto na relação entre professores e alunos? Não existem relações humanas desprovidas de afetividade. Sempre que nos comportamos estamos sentindo alguma coisa. O sentir é componente essencial do comportar-se, e é ele mesmo um comportamento.

Quando tentamos reprimir nossa afetividade, nossos comportamentos emocionais, desta repressão surgem outros produtos emocionais bastante nocivos: ansiedade, medo, raiva, tristeza etc. Relações perpassadas por ansiedade, medo, raiva, tristeza, tendem a se tornarem insípidas, ou seja, tendem a se tornarem pouco saborosas ou sem nenhum sabor. Se tornam relações bastante rígidas. Relações assim se transformam em uma potencial fonte de estímulos aversivos que provocam comportamentos de fuga e esquiva. Tais comportamentos se fazem notar pela evasão escolar, depredação do patrimônio escolar, notas baixas, pouco envolvimento em tarefas escolares etc.

A professora Helena mostra-nos que é possível resgatar a afetividade nas relações entre alunos e professores. Ela ensina que estas relações podem ser reforçadoras e que o professor pode usar o reforço positivo em seu benefício, ou seja, que ele pode usar o reforço positivo para reforçar comportamentos mais produtivos por parte dos seus alunos. Contudo, é necessário ter o cuidado para não apresentar reforços positivos contingentes a comportamentos improdutivos, comportamentos problemáticos.

Não é o uso indiscriminado de reforçamento positivo que vai transformar o sistema educacional. Reforço positivo pode fortalecer comportamentos geradores de problemas. Esta talvez seja uma das questões a se levantar com relação a Professora Helena. Ela age de modo bastante afetivo. Mas vale questionar: ela discrimina bem os comportamentos que reforça, ou seja, ela usa reforço positivo contingente a comportamentos mais produtivos por parte de seus alunos?

A professora Helena mostra-se sempre muito preocupada com os problemas pessoais de seus alunos. Ela se desdobra para resolver estes problemas. É preciso cuidado! Existem as diferentes especialidades e elas devem ser respeitadas. Nenhum professor deve achar que é um profissional da psicologia. Problemas comportamentais são fenômenos da alçada dos psicólogos(as)! Professores que agem como se fossem profissionais da psicologia contribuem e muito para a patologização de problemas do cotidiano escolar, o que acaba abrindo precedente para uma medicalização desnessária destes problemas. E dá-lhe ritalina para tantos transtornos de déficit de atenção e hiperatividade! A indústria farmacêutica agradece!

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Referências:

FOUCAULT, M. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. 31 ed. Petrópolis (RJ), Ed. Vozes, 2006.


6 comentários:

  1. Boa noite, Bruno.
    Parabéns pelo blogue, de que já sou seguidor. Título bem original e conteúdos interessantes.
    Abraço desde Lisboa.
    António Pereira
    http://acordo-ortografico.blogspot.com
    http://portuguesemforma.blogspot.com

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    1. Obrigado Antônio. Fique a vontade e sinta-se em casa. Sua visita sempre será muito bem vinda!

      Abraços.

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  2. Olá multiplicador!
    Muito boa sua postagem, principalmente porque traz boas referências.
    A professora Helena realmente conquistou a galerinha telespectadora,inclusive minha filha, mas confesso que não sou muito fã dela. Acho ela meio robótica, sem sal, sem emoção. Poderia ser mais espontânea. É claro que digo isto por se tratar de uma personagem, caso contrário não me atreveria a julgá-la.

    http://www.educasempre.com/

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    1. Erica, foram muito boas as suas observações. Apesar de meiga a Profa. Helena parece mesmo meio insípida. Confesso que ela também encantou minha filhinha que vai completar 3 anos em maio. Não sei se esta falta de espontaneidade é em função da personagem ou é um problema da atriz. Mas temos que concordar que apesar de toda falta de espontaneidade, ela traz para a relação com seus alunos o componente da afetividade, o que acaba sendo um diferencial.

      Obrigado pela participação. Abraços e bom fim de semana!

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  3. Adorei!!! seu post me ajudou a esclarecer a minha resposta numa pergunta da faculdade!!!

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    1. Que bom que o texto te ajudou Maria de Fátima! Obrigado pela visita e participação. Volte sempre.

      Abraços.

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