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segunda-feira, 18 de agosto de 2014

Do Que Você Tem Medo?: uma análise comportamental das reações fóbicas

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Fobia vem do grego Fobos. Para os gregos Fobos era filho de Ares. Na Mitologia Grega Ares é o deus da guerra e Fobos é a personificação do medo e do terror. Fobos era levado pelo pai para as guerras para aterrorizar e afugentar os inimigos. Se Fobos é a personificação do terror, a fobia, seria, então, um tipo de reação emocional marcada exclusivamente pelo medo.

Na fobia o medo é o ator principal e também o plano de fundo, sendo usado como critério para identificá-la. Geralmente quatro condições devem ser satisfeitas para caracterizar uma fobia: 1) A ocorrência de um medo intenso; 2) O medo estar relacionado com uma situação específica; 3) O medo criar a condição para a fuga da situação responsável por sua ocorrência; 4) O medo ser acompanhado por alterações fisiológicas como a taquicardia, a sudorese, o tremor, as vertigens etc.

O Analista do Comportamento olharia com suspeitas para as condições enumeradas. Em primeiro lugar, ele não entenderia a fobia como ela normalmente é entendida. Nas abordagens psicodinâmicas, aquelas que compreendem o comportamento como o produto do funcionamento de um aparelho mental, uma fobia seria a expressão de conflitos inconscientes. A cura ocorreria pela identificação destes conflitos, que por sua vez promoveria uma catarse, ou seja, uma descarga emocional que colocaria fim ao desgaste energético gerado pelos próprios conflitos. Neste sentindo, a fobia seria uma espécie de patologia mental.

O Analista do Comportamento assumiria uma posição bastante distinta. Para ele uma fobia não é uma doença. Aliás, é bom que se diga que ele suspeitaria não somente da fobia enquanto manifestação psicopatológica, como também entenderia que o termo "fobia" serve ao único propósito de descrever a topografia de alguns comportamentos que ocorrem enquanto a pessoa está sentindo um medo intenso, medo que notoriamente está relacionado à exposição a certas contingências de reforço. Isso significa que a descrição é insuficiente, pois ela não revela a funcionalidade do comportamento, ou seja, ela não revela os motivos que produzem o medo e nem como a sua ocorrência está relacionada a circunstâncias bastante específicas.

O Analista do Comportamento seria ainda mais criterioso. Ele não assumiria o medo como a causa da fuga. O medo e a fuga são causados pelas mesmas circunstâncias. O que nelas existe para provocar o medo e a fuga é a presença de controle coercitivo. Como o controle coercitivo assumiu o poder de gerar o medo e de produzir a fuga é algo que se deve investigar na história de reforçamento do indivíduo que sente medo e também foge. Cai, portanto, por terra, o terceiro critério para a caracterização de uma fobia: "O medo criar a condição para a fuga da situação responsável por sua ocorrência". O medo não é a causa da fuga. Ele é tão produto quanto o comportamento de fugir da situação temida. Emoções não são causas de comportamento. Emoção também é comportamento. Isso já foi longamente trabalhado em outras postagens, basta clicar aqui para acessá-las.

O Analista do Comportamento também derrubaria a condição de número quatro, pois o medo é um exemplo de comportamento emocional, o que significa que ele não é marcado apenas pelo aparecimento de respostas reflexas produzidas a partir de condicionamento respondente: taquicardia, tremor, sudorese etc. Ele também é marcado pela ocorrência de consequências que alteram a frequência com que ocorre, o que o caracteriza como comportamento operante. A consequência é manter afastada a situação temida. Sempre que exposto à situação temida o sujeito foge. Fugir é um exemplo de comportamento mantido por reforçamento negativo.

Portanto, a fobia não é uma doença. A fobia é um conjunto de comportamentos que envolve a fuga de uma situação temida. A situação temida é fonte de controle aversivo. O que a fuga faz é afastar os estímulos aversivos. Mas quanto mais o sujeito foge ou mesmo evita a situação temida, mais ele diminui as chances de que o medo enquanto comportamento emocional seja colocado em extinção. É aí que entra a análise funcional. Ela revelará a frequência com que o medo ocorre, que estímulos aumentam as chances dele ocorrer e, que, sobretudo, estabelecem a ocasião para o comportamento de fugir. Feito isso, podem ser planejadas intervenções que tenham como tônica a exposição do sujeito às situações relacionadas com o medo e com a fuga.

Está exposição contribui para que seja rompido o pareamento de estímulos estabelecido por meio de condicionamento respondente. Lembram-se do cão de Pavlov? Quando Pavlov apresentou o som sem que ele fosse associado com a comida, o que acabou acontecendo? O som perdeu a sua função de eliciar a resposta de salivação. A situação temida é o estímulo condicionado que provoca as respostas reflexas que constituem a dimensão respondente do medo: taquicardia, sudorese, tremor, desarranjo gastrointestinal etc. A exposição planejada ao estímulo condicionado diminuirá o mal estar provocado por todas estas respostas reflexas, pois este estímulo sofrerá uma extinção gradual, perdendo, assim, sua função de provocar as respostas enumeradas.

Algo novo ocorre quando o mal estar é minimizado. O sujeito diz para si mesmo: "sou capaz de enfrentar esta situação". Ele produz uma regra que sustentará o comportamento de enfrentamento da situação temida. Essa regra descreve as contingências de uma nova forma: "não preciso ter medo de enfrentar esta situação". As regras anteriores diziam: "tenho medo desta situação, não consigo enfrentá-la". O sujeito passa a descrever as contingências de reforçamento de um modo diferente, e nesta descrição os estímulos aversivos perdem o seu lugar de destaque. Caem por terra as antigas regras, aquelas que faziam com que a situação parecesse temerosa.

Portanto, numa análise comportamental, o que interessa é identificar as contingências que modelaram e que fazem a manutenção dos comportamentos fóbicos, comportamentos que envolvem as dimensões respondentes e operantes do medo. Isso é o mesmo que submeter a fobia a uma análise funcional, análise que fornecerá os parâmetros para a construção de intervenções que coloquem em extinção o comportamento de fugir das situações temidas, e ao mesmo tempo terminem o mal estar produzido por estas situações.


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sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Vontade: um exemplo de explicação fictícia para o comportar-se

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

A professora perguntou ao Joãozinho: "Por que você bateu no Pedrinho?". Joãozinho respondeu: "porque me deu vontade". Fica difícil conjecturar sobre as causas do comportamento de Joãozinho apenas com a resposta fornecida por ele. Deveríamos ficar satisfeitos com a resposta, afinal o ser humano é um ser de vontades, um ser que age a partir daquilo que sente. Mas, as coisas não são bem assim, e em outros textos já tivemos a oportunidade de analisar que emoções não são causas de comportamentos. Emoções são também comportamentos, e antes de explicarem qualquer coisa, elas também precisam ser explicadas à luz das contingências de reforço. Para entender um pouco mais sobre as emoções clique aqui.

Supondo que a professora tivesse a oportunidade de observar o comportamento de Joãozinho, algumas pistas poderiam surgir e fornecer indicações dos motivos que levaram-no a agredir Pedrinho. Talvez Pedrinho tenha arrancado das mãos de Joãozinho um brinquedo. Então, alguém poderia dizer: "Joãozinho agiu com base em um impulso de agressividade". A explicação ainda não seria suficiente, pois além de explicar o impulso, teríamos também que explicar como este é acionado, e por sua vez restaria esclarecer como ele age provocando comportamentos agressivos, ou seja, como se transformaria no fim das contas em um comportamento que tem como meta a agressão de outrem. O impulso não fornece uma saída mais interessante do que a explicação que passa pelos estados emocionais agrupados sobre o termo "vontade".

"Joãozinho agiu com agressividade porque perdeu o brinquedo". A explicação ainda não é suficiente, mas já fornece pistas mais concretas a respeito do comportamento agressivo de Joãozinho. Perder o brinquedo significa a suspensão de um reforço positivo importante. Se for possível observar os comportamentos de Joãozinho em situações semelhantes, situações de perda de reforçamento positivo, e isso nos levar a constatar que ele age agressivamente na maior parte das vezes, teríamos dados que permitiriam conjecturas sobre a capacidade de lidar com frustrações de nosso jovenzinho.  Incapacidade de lidar com frustrações pode significar uma história de vida em que os comportamentos de Joãozinho quase sempre eram reforçados em esquema de reforçamento contínuo. Joãozinho não foi treinado para aquelas situações em que o reforço era atrasado com relação ao comportamento reforçado.

Se no passado quando Joãozinho agrediu seus pares ele obteve algum reforçamento, aprendeu, assim, que o comportamento de agredir é uma potencial fonte geradora de reforços. Onde fica a vontade de Joãozinho em agredir? Ela se reduz aos estados emocionais sentidos quando Joãozinho enfrenta situações de frustrações. Tanto o comportamento de agredir quanto o que é sentido quando se é frustrado têm relação com aquilo que está ocorrendo no ambiente, e o que está ocorrendo no ambiente presente tem relação com o que ocorreu no passado quando houve a exposição a certas contingências de reforço.

Todo o raciocínio construído até aqui poderia ser objetado, e os mais obtusos diriam que há uma intencionalidade no comportamento de Joãozinho, pois ele é dirigido para um alvo, neste caso Pedrinho. O comportamento não pode ser causado por aquilo que não aconteceu. Explico-me. Eventos futuros não podem ter qualquer efeito sobre eventos presentes, pois por definição o futuro ainda não aconteceu. Qualquer dicionário que o leitor consultar vai definir vontade como a capacidade da pessoa agir com uma intencionalidade definida. Neste sentido, a vontade dá ao comportamento uma direção bastante definida, como se este fosse uma flecha atirada contra um alvo. No entanto, a meta de atingir o alvo não é a explicação para o comportamento de voar da flecha. A meta enquanto um evento futuro não pode causar um evento presente.

Se a flecha voa até o alvo é porque houve quem a disparasse. Houve um evento no presente que permitiu o lançamento da flecha, neste caso o arqueiro com suas habilidades de atirar. Estas habilidades foram modeladas por exposições a contingências de reforço no passado. No passado essa exposição permitiu que se estabelecesse relações de dependência entre eventos comportamentais e eventos ambientais. Os eventos comportamentais seriam os comportamentos de praticar tiro ao alvo. Os ambientais seriam as instruções sobre como atirar e as consequências proporcionadas pelo seguimento das mesmas.

Normalmente o comportamento dotado de intencionalidade é chamado de voluntário. O termo só faz obscurecer as variáveis envolvidas na determinação do comportar-se, pois a rigor não existem comportamentos voluntários, ou seja, comportamentos livres de determinação, produtos explícitos do livre arbítrio. Isso não quer dizer que não sejamos capazes de escolhermos entre alternativas diferentes. Sim, nós somos, mas, mesmo o comportamento de escolher não está livre de determinação.

Vontades e impulsos pouco explicam. Vontade é um estado emocional, uma tendência para agir de uma determinada forma. Mas, tanto o que é sentido como emoção quanto a tendência em agir de uma determinada maneira são produtos das contingências de reforço. Alguém que diz que está com vontade de comer chocolates, está dizendo que chocolate é um reforço positivo. Está também dizendo que o chocolate enquanto reforço positivo proporciona estados corporais agradáveis (emoções). Mas, sobretudo, a pessoa está sinalizando que não come chocolate há algum tempo, portanto, está privada do reforço chocolate, o que aumenta a probabilidade de sair em busca da obtenção deste reforço.

Contudo, a ideia de comer chocolate não surge no vácuo. Houveram contingências de reforço que aumentaram a probabilidade de ocorrência desta. A pessoa ouviu alguém falar sobre chocolate. Viu na TV um comercial sobre chocolates. Talvez a páscoa esteja próxima, e ela sempre compra ovos de chocolate nesta ocasião. Ou quem sabe seja um sábado, e nos sábados ela come chocolate como sobremesa após o almoço, de modo que opera sobre o seu comportamento um esquema de reforçamento em intervalo fixo. Enfim, muitas são as variáveis que podem explicar a vontade de comer chocolate. Antes de ser uma explicação, a vontade é um produto a ser explicado, fruto de incontáveis operações comportamentais.

Portanto, vontade é mais um exemplo de explicação fictícia para o comportar-se. O termo no máximo pode indicar o tipo de controle que está operando sobre o comportamento que se supõe ser um produto da vontade, mas mesmo assim precisa ser contextualizado de modo que se identifique que condições foram responsáveis pelo aparecimento daquilo que se sente. Não se trata de desprezar o que é sentido, afinal, o que se sente, fornece pistas sobre as contingências de reforço responsáveis tanto pelo sentir quanto pelo agir. Todavia, sempre é bom salientar que o agir nunca é um produto do sentir.


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quinta-feira, 11 de abril de 2013

Metamorfoses

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Há não muito tempo vi na foto de capa do facebook de alguém uma foto de um milho de pipoca e do lado do milho uma pipoca. Logo abaixo estava escrito que grandes mudanças ocorrem de dentro para fora. A imagem você pode ver aí ao lado. Fiquei pensando sobre o assunto e me perguntei: "o Behaviorismo Radical concorda com esta afirmação?" Se ela estiver se referindo a possibilidade de que mudanças são originadas por um eu interior, o Behaviorismo Radical vai discordar diametralmente.

Mas mesmo sabendo a posição do Behaviorismo Radical com relação a este tema, confesso que continuei encantado com a metáfora do milho que quando aquecido se transforma em pipoca. Muita gente gosta de usar essa historinha da pipoca para justificar que é dentro do organismo que se processam as mudanças que se fazem visíveis em seu exterior. No entanto, poucos são os que param para pensar que para o milho se transformar em pipoca precisam existir algumas condições:

1. É necessário um fogão com uma panela, ou um microondas e um pacote de pipoca de microondas;
2. A panela precisa ser aquecida com um pouco de óleo em um fogão, o mesmo é válido para o pacote de pipoca, mas este é aquecido no microondas;
3. É preciso existir alguém para controlar o ponto de estouro das pipocas, pois elas podem se queimar ou se transformarem em piruá. Aqui em Minas Gerais piruá é o milho de pipoca que não estourou.

Sem as condições 1, 2 e 3 não há pipocas. Simples assim! A mudança não está no interior do milho. O milho pode até reunir as características genéticas para se transformar em pipoca. Isso é fato! Mas estas características de nada adiantariam se as condições 1, 2 e 3 não fossem atendidas. Penso que o leitor já deva estar capitando a minha mensagem. O que são as condições 1, 2 e 3? Estas se referem às contingências de reforço. Elementar meu caro Watson!

Se alguma coisa ocorre dentro do organismo como as mudanças fisiológicas, e se estas são descritas como a emoção "x" ou "y", é porque houveram contingências de reforço que possibilitaram a ocorrência destas mudanças. Antes que me acusem de desconsiderar as contingências filogenéticas, trato de adiantar que elas também têm um papel em tudo isso. Mas como isso é quase uma obviedade, não entrarei no mérito da questão.

O que quero que fique claro é que o que é sentido é produto das contingências de reforço da mesma forma que o comportamento também o é. Se não houvesse fogo todo o potencial genético do milho não entraria em ação e ele não se transformaria em pipoca. Então, o que de fato é relevante são as condições que possibilitam a manifestação deste potencial. Transpondo a metáfora para o caso humano de modo que possamos explicar porque nos comportamos assim ou assado, o que é relevante é identificar as contingências que produzem tanto o que é sentido quanto aquilo que fazemos enquanto nos sentimos desta ou daquela maneira.

Portanto, a origem das mudanças não estão no interior do organismo, mas nas condições que afetam o seu comportar-se. Estas condições também afetam o que sentimentos, pois os sentimentos também são comportamentos. Clique aqui para ser direcionado para outros textos em que o comportamento emocional é debatido com mais detalhes. Se é comum tomarmos sentimentos como exemplos de causas de comportamentos, é porque geralmente eles ocorrem enquanto nos comportamentos, próximos ou antes de nos comportarmos. A proximidade temporal entre o sentir e o agir acaba gerando toda esta confusão.

Por conseguinte, para que os comportamentos se modifiquem e as metamorfoses possam operar, não são os sentimentos que precisam ser alterados. Qualquer mudança é produto em modificações que se processam nas contingências de reforço. Alterando as contingências alteramos comportamentos e sentimentos. Então, sempre que alguém te contar a história da pipoca, lembre-se de olhar para as contingências responsáveis pela transformação do milho. Agindo assim você aumenta as chances de olhar para as contingências que operam em sua vida. Não se esqueça, as metamorfoses estão nas contingências!

Vixe, termino este post com vontade de comer pipoca! Rs!!! E você, o que achou do texto? Poste seu comentário abaixo.

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quinta-feira, 14 de março de 2013

Dos Modelos Teóricos aos Modos de Intervenção: Terapia Comportamental e Terapia Comportamental-Cognitiva

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

A junção entre os modos de intervenção clínica baseados nos modelos teóricos do comportamentalismo de orientação behaviorista radical e no cognitivismo, é tomado como algo que é tão natural, que faz parecer que não há incompatibilidades entre estes dois modelos que fazem referências a teorias que distam diametralmente uma da outra, é como se uma estivesse numa extremidade de uma reta e a outra na outra extremidade. As duas pontas da reta jamais vão se encontrar a não ser que a reta possa ser curvada, mas se isso ocorrer a reta deixa de ser reta, ou seja, a reta perde as suas características que a definem como sendo uma reta.

A terapia comportamental de orientação behaviorista radical perde suas características que a definem como comportamental ao seu unir à orientação cognitivista. Que características? A principal de todas elas é tomar o comportamento como foco da sua intervenção, entendendo-o como relação que se estabelece entre o organismo que se comporta e o ambiente. Por ambiente entende-se tudo aquilo que pode afetar o comportar-se (SKINNER, 1998). Ambiente é aquilo que é externo à ação e não o que é externo ao organismo (MATOS, 1999).

Nesta definição de ambiente entram os eventos privados, eventos que na concepção de Skinner (1993/1998) ocorrem num mundo debaixo da pele. Ainda fazendo referência a Skinner (1998), com relação aos eventos privados e à definição de ambiente ele diz:

"Quando dizemos que o comportamento é função do ambiente, o termo "ambiente" presumivelmente significa qualquer evento do universo capaz de afetar o oganismo. Mas parte do universo está encerrada dentro da própria pele de cada um. [...] Não temos necessidade de supor que os eventos que acontecem sob a pele de um organismo tenham, por essa razão, propriedades especiais. Pode-se distinguir um evento privado por sua acessibilidade limitada mas não, pelo que sabemos, por qualquer estrutura ou natureza especiais." (SKINNER, 1998, p. 281-282).

Eventos privados não são sinônimos de eventos mentais (MATOS, 1998). A acessibilidde limitada não transforma os eventos privados em eventos mentais. Eles continuam tendo propriedades físicas e temporais, ou seja, podem ser localizados no tempo e espaço, sendo, portanto, fenômenos naturais, fenômenos passíveis de serem estudados com os métodos das ciências naturais. O que torna difícil o estudo destes eventos é a sua acessibilidade, pois a comunidade verbal precisa arranjar contingências de reforço que permitam ao indivíduo falar de seu mundo privado, mas isso não é nada fácil, pois a comunidade verbal não tem acesso a este mundo. Então, ela faz isso com base em eventos públicos correlatos que acompanham os eventos privados. Para uma discussão mais pormenorizada de como esse processo acontece, sugiro a leitura de um outro texto deste blog: "A Difícil Tarefa de Falar de Sentimentos."

O que fica claro é que o Behaviorismo Radical tem o arsenal teórico necessário para lidar com os eventos subjetivos, eventos geralmente equiparados a eventos mentais, sem que seja necessário recorrer ao mentalismo. Então por que a Terapia Comportamental, que é a aplicação dos métodos derivados da Análise do Comportamento e dos princípios teóricos e filosóficos do Behaviorismo Radical no entendimento e modificação do comportamento no setting clínico teria que recorrer ao cognitivismo? A terapia comportamental precisa do suporte teórico do cognitivismo?

É aqui que entra nossa reflexão que pretende diferenciar "bife à milanesa de bife ali na mesa". Bife à milanesa é uma forma de fritar bifes para que fiquem com uma crosta crocante, e bife ali na mesa é um bife de qualquer espécie localizado em cima de uma mesa. Da mesma forma Terapia Comportamental é uma coisa e Terapia Comportamental-Cognitiva é outra coisa completamente diferente, e a segunda não complementa e nem é uma espécie de evolução da primeira, antes representa muito mais um retrocesso do que um avanço.

Portanto, a adoção de um ou outro modelo teórico leva a modos de intervenção bastante distintos. Se o terapeuta comportamental considera como foco de sua intervenção o comportamento, ele analisará as contingências por trás de sua determinação, e em seguida planejará modos de intervenção que levem a modificações nestas contingências, de modo que estas modificações produzam alterações no comportamento. Ele agirá desta maneira porque entende e tem condições de provar que o comportamento é modelado pelo ambiente, ou melhor dizendo, que ele é modelado pelas contingências de reforço, e que as modificações nestas contingências levam a mudanças nas formas de agir.

Já o terapeuta cognitivista que adota a denominação comportamental-cognitivo ou cognitivo-comportamental, entende que o comportamento até pode ser influenciado pelo ambiente, no entanto, o mesmo é produto de processos cognitivos. Rangé (1998), ao se referir ao que chama de PCC (Psicoterapia Cognitivo-Comportamental), diz o seguinte:

"A  PCC é uma modalidade terapêutica desenvolvida a partir dos princípios de aprendizagem e, posteriormente, da ciência cognitiva, conforme estabelecidos pela psicologia experimental. Seu objeto de interesse é o comportamento como tal e seus fatores determinantes, como condições ambientais e processos cognitivos específicos, e não supostos processos subjacentes. [...] Segundo a PCC, os comportamentos que uma pessoa apresenta evidenciam a ação de princípios científicos do comportamento desenvolvidos pela psicologia experimental especialmente no campo da aprendizagem, da psicologia cognitiva e do estudo das emoções, além de conhecimentos gerados nas áreas de psicologia social, psiquiatria, psicologia clínica, desde que experimentalmente validados. Estes princípios estabelecem que o comportamento humano é grandemente determinado por suas relações com o ambiente atual e pela mediação cognitiva." (RANGÉ, 1998, p. 35).

Interessante notar que a citação acima é retirada de um artigo intitulado "Psicoterapia Comportamental", artigo em que o autor deveria apresentar a psicoterapia comportamental ao invés de tecer considerações sobre o que chama de PCC. A questão é que o termo comportamental é tão genérico que se faz necessário elucidar que referências teóricas são adotadas quando se fala de terapia comportamental, por isso este texto em diversos momentos sublinhou que a terapia comportamental do qual está se falando é aquela orientada pelos princípios teóricos e filosóficos do Behaviorismo Radical, e que isso fique bem claro.

Fica claro na citação de Rangé (1998) que os cognitivistas entendem os processos cognitivos como fatores determinantes na ocorrência do comportamento, e sublinham que estes são os fatores mais importantes a serem considerados. Os processos cognitivos, como crenças e mapas cognitivos vão mediar a ocorrência do comportamento, e a atuação do terapeuta deve visar a modificação destes processos, e sem que isso seja feito não há alterações no comportamento. Os terapeutas cognitivos até adotam a utilização de técnicas de modificação de comportamentos oriundas da análise do comportamento e das teorizações do Behaviorismo Radical, mas para eles estas técnicas apenas dão um suporte para que comportamentos sejam influenciados, pois a verdadeira mudança é aquela que decorre das alterações em processos cognitivos. Por causa da utilização destas técnicas é que fazem uso das denominações cognitivo e comportamental simultaneamente.

Talvez o leitor esteja se perguntando, mas o trabalho de terapeutas cognitivos-comportamentais não produz resultados? Isso é difícil de ser refutado. Realmente há resultados, mas isso é explicável. Qualquer terapia a princípio pode produzir resultados, até mesmo terapias de orientação psicanalítica. Ainda que não se adote o comportamento como foco da intervenção e sim as ficções mentalistas, durante o trabalho terapêutico são arranjadas contingências de reforço que levam a mudanças comportamentais, todavia, estas contingências são arranjadas acidentalmente, ou seja, o planejamento delas não ocorre da mesma forma como na terapia comportamental de orientação behaviorista radical.

A terapia psicanalítica nem é um bom parâmetro de comparação, pois nesta não há nenhum planejamento, e se surgem contingências que produzem modificações comportamentais, estas são um produto do mero acaso. Já na chamada terapia cognitivo-comportamental há algum planejamento, ainda que este não atue diretamente sobre o comportamento, pois o foco da intervenção são os processos cognitivos. Todavia, a postura mais ativa do psicoterapeuta potencializa as chances de que sejam arranjdas contingências que gerem mudanças comportamentais, e certamente a valorização da relação terapêutica, algo que os terapeutas comportamentais-cognitivos levam bastante a sério, cria circunstâncias que favorecem a mudança de comportamentos.

Mesmo que eles atuem sobre processos cognitivos, que na verdade são exemplos de comportamentos, acabam atuando sobre variáveis importantes e que levam a mudanças comportamentais. Crenças, que são exemplos de mapas cognitivos que influenciam a percepção da realidade, de acordo com os cognitivistas, são na verdade exemplos de descrições de contingências (regras) geradas por operantes verbais. Se as crenças são modificadas, ou seja, se os operantes verbais que controlam a emissão de outros comportamentos são modificados, é de se esperar que esses outros comportamentos também se modifiquem. Ao menos no que tange a probabilidade de emissão estes comportamentos serão modificados, pois sendo as regras estímulos discriminativos que sinalizam a ocorrência de determinados reforços, a sinalização atuará como fator no aumento ou diminuição da probabilidade de que certos comportamentos ocorram.

Logicamente que a modificação de regras não é suficiente, pois estas também são comportamentos, e por sua vez estes comportamentos são produto de outras contingências de reforço. Regras se alteram quando são modificadas as contingências de reforço que as originam. Então, o foco da intervenção devem ser as contingências de reforço que produzem as regras, as contingências arranjadas pelas regras e o controle exercido por elas na emissão de certos comportamentos e as outras contingências que junto com as regras também afetam o comportar-se.

Portanto, a adoção deste ou daquele modelo teórico acaba levando a modos diversos de atuação. Se trabalho com crenças, vou procurar atuar sobre variáveis intermediárias, o que na prática é um exercício de mentalismo. Atuando sobre variáveis intermediárias posso até conseguir alguma mudança, pois acidentalmente contingências de reforço podem ser criadas, contingências que produzem modificações comportamentais. Mas se trabalho com contingências de reforço ao invés de crenças ou mapas cognitivos, atuarei diretamente sobre aquelas variáveis relevantes para que ocorram mudanças comportamentais efetivas, e neste caso as mudanças não serão um produto acidental do processo psicoterápico.

Por conseguinte, encontramos no Behaviorismo Radical e Análise do Comportamento os meios necessários para que deliberadamente planejemos contingências de reforço que levem a mudanças comportamentais efetivas, sem que seja necessário fazer referência à conceitos que ao invés de representarem um avanço, são uma espécie de retorno ao mentalismo.

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REFERÊNCIAS:

MATOS, M. A. Behaviorismo metodológico e behaviorismo radical. In: RANGÉ, B. (Org.).
Psicoterapia comportamental e cognitiva: pesquisa, prática,  aplicações e problemas.  2. ed.  Campinas: Editorial Psy, 1998. p. 27-34.

MATOS, M. A. Com o que o Behaviorista Radical trabalha?. In: BANACO, R. (Org.). Sobre Comportamento e Cognição: aspectos teóricos, metodológicos e de formação em Análise do Comportamento e Terapia Cognitivista. 2 ed. Santro André: ARBytes, 1999, p. 45-53.

RANGÉ, B. Psicoterapia Comportamental. In: RANGÉ, B. (Org.). Psicoterapia comportamental e cognitiva: pesquisa, prática,  aplicações e problemas.  2. ed.  Campinas: Editorial Psy, 1998. p. 27-34.

SKINNER, B. F. Ciência e comportamento humano. 10. ed. São Paulo: Martins Fontes, 1998.


SKINNER, B. F. Sobre o Behaviorismo. São Paulo: Cultrix, 1993. 
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quarta-feira, 20 de fevereiro de 2013

Professora Helena: a professora que encantou o Brasil

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

A novela "Carrossel" exibida pelo SBT no horário nobre tem aterrorizado a concorrência. Vem batendo facilmente o IBOPE de programas exibidos no mesmo horário, e tem assustado inclusive a Globo, pois a emissora vê parte da audiência do Jornal Nacional migrar para o SBT. A dupla William Bonner e Patrícia Poeta têm enfrentado um forte concorrente, uma novela infantil que é o remake de uma novela mexicana filmada na década de 1980 e exibida pelo SBT nos anos de 1991 e 1995.

A criançada está adorando. Mas também existem muitos adultos vidrados na novela, seja para seguirem seus filhos, ou porque os personagens de Carrossel conseguem exercer um fascínio sobre o público adulto. Um destes personagens é a professora Helena. Helena é professora de uma escola conhecida como Escola Mundial. Ela leciona no terceiro ano, e enfrenta uma turminha que lhe apresenta muitos desafios. Mas com muito afeto e carinho ela consegue se aproximar de seus alunos ajudando-os a superarem os seus problemas, não somente os educacionais, como também os problemas da vida pessoal.

Contrastando com o modelo de docência da professora Helena, existe de outro lado a diretora Olívia. Olívia defende uma linha de educação mais rígida, e nesta linha a disciplina é conseguida através de controle coercitivo, ou seja, através de punições ou de ameças de punições. Por um lado temos então Olívia, representante de um modelo educacional em vias de falência, ou seja, de um modelo educacional que usa a punição ou a ameaça de punição como meio para a obtenção de disciplina. De outro lado temos a professora Helena, representante de um modelo educacional que rompe com o paradigma da autoridade disciplinar, aquele paradigma ao estilo Foucaultiano, que mantém a ordem por meio da vigilância.

Foucault (2006) fala-nos do panóptico, um modelo de prisão que tem no centro uma torre. As selas da prisão ficam dispostas ao redor da torre, de modo que por meio desta a vigilância pode ser mantida com um contingente menor de funcionários. O panóptico é um dispositivo que ajuda a manter a vigilância e o controle através do uso de coerção, através do uso de ameaças de punições, punições que podem ocorrer quando menos se espera. Punições inesperadas e apresentadas em esquemas de reforçamento intermitente ajudam a criar um ambiente bastante hostil.

Foucault (2006) extrapola sua reflexão sobre o panóptico e a lógica das prisões para outras esferas, mencionando, que a cultura da vigilância se faz presente em outras instituições, inclusive nas escolas. Ela não é exclusiva das prisões e forças armadas. A vigilância é um meio para se manter o controle. Nas escolas de padrões arquitetônicos mais antigos podemos ver os traços desta cultura. É comum a existência de um palanque nas salas de aula. Neste palanque o professor mantém-se em um degrau mais alto que seus alunos. Esta é uma forma de demonstrar a posição de poder que o professor ocupa, de demonstrar que não pode existir aproximações entre ele e seus alunos, que ele é a fonte do saber, e os alunos devem receber esse saber passivamente.

A diretora Olívia é produto deste tipo de concepção educacional, ela e muitos professores que ainda usam o controle coercitivo como forma de manterem a disciplina, e mal sabem estes professores que coerção gera comportamentos emocionais que interferem na aprendizagem. Pobres coitados, precisam rever seus conceitos. Já a professora Helena é a legítima representante de um modelo educacional que rompe com a distância estabelecida entre professores e alunos.

Helena estabelece com seus alunos relações bastante reforçadoras. Ela traz para estas relações o componente da afetividade, componente banido pelo paradigma educacional que defende o uso da coerção como meio para a obtenção de disciplina. Quem disse que não pode existir afeto na relação entre professores e alunos? Não existem relações humanas desprovidas de afetividade. Sempre que nos comportamos estamos sentindo alguma coisa. O sentir é componente essencial do comportar-se, e é ele mesmo um comportamento.

Quando tentamos reprimir nossa afetividade, nossos comportamentos emocionais, desta repressão surgem outros produtos emocionais bastante nocivos: ansiedade, medo, raiva, tristeza etc. Relações perpassadas por ansiedade, medo, raiva, tristeza, tendem a se tornarem insípidas, ou seja, tendem a se tornarem pouco saborosas ou sem nenhum sabor. Se tornam relações bastante rígidas. Relações assim se transformam em uma potencial fonte de estímulos aversivos que provocam comportamentos de fuga e esquiva. Tais comportamentos se fazem notar pela evasão escolar, depredação do patrimônio escolar, notas baixas, pouco envolvimento em tarefas escolares etc.

A professora Helena mostra-nos que é possível resgatar a afetividade nas relações entre alunos e professores. Ela ensina que estas relações podem ser reforçadoras e que o professor pode usar o reforço positivo em seu benefício, ou seja, que ele pode usar o reforço positivo para reforçar comportamentos mais produtivos por parte dos seus alunos. Contudo, é necessário ter o cuidado para não apresentar reforços positivos contingentes a comportamentos improdutivos, comportamentos problemáticos.

Não é o uso indiscriminado de reforçamento positivo que vai transformar o sistema educacional. Reforço positivo pode fortalecer comportamentos geradores de problemas. Esta talvez seja uma das questões a se levantar com relação a Professora Helena. Ela age de modo bastante afetivo. Mas vale questionar: ela discrimina bem os comportamentos que reforça, ou seja, ela usa reforço positivo contingente a comportamentos mais produtivos por parte de seus alunos?

A professora Helena mostra-se sempre muito preocupada com os problemas pessoais de seus alunos. Ela se desdobra para resolver estes problemas. É preciso cuidado! Existem as diferentes especialidades e elas devem ser respeitadas. Nenhum professor deve achar que é um profissional da psicologia. Problemas comportamentais são fenômenos da alçada dos psicólogos(as)! Professores que agem como se fossem profissionais da psicologia contribuem e muito para a patologização de problemas do cotidiano escolar, o que acaba abrindo precedente para uma medicalização desnessária destes problemas. E dá-lhe ritalina para tantos transtornos de déficit de atenção e hiperatividade! A indústria farmacêutica agradece!

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Referências:

FOUCAULT, M. Vigiar e Punir: história da violência nas prisões. 31 ed. Petrópolis (RJ), Ed. Vozes, 2006.


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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Autoestima: uma breve análise comportamental

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Vamos começar pelo desmembramento da palavra: auto + estima. Auto é relativo a si mesmo. Autobiografia, por exemplo, é uma narrativa que conta a história do próprio autor que a escreveu. Estima é o apreço que se tem por alguém. Estima vem do verbo estimar. Estimar significa determinar o valor. Na frase, "os cientistas estimam que o sol ainda brilhará por 5 bilhões de anos", estimar significa calcular, ou seja, os cientistas calculam que o sol ainda vai brilhar durante muito tempo. De estimar vem a palavra estimativa, que é o mesmo que calcular aproximadamente. Quando se faz uma estimativa, na verdade está se calculando aproximadamente o valor de alguma coisa. Então o cálculo dos cientistas são estimativas, pois não podem determinar aproximadamente por quanto tempo o sol vai brilhar.

O que importa é que estimar significa determinar o valor de algo. A todo instante estamos determinando o valor das coisas. Uma pessoa pode ter para nós um valor maior ou menor dependendo do seu comportamento. Se seu comportamento é para mim fonte de reforçamento positivo, certamente essa pessoa terá um grande valor para mim. Valorizamos, por exemplo, os nossos pais, pois apesar de todos os problemas eles nos ajudaram e ajudam em diversas circunstâncias da vida. Sim, há aqueles que por motivos vários não valorizam seus pais, e isso é explicável pela história de reforçamento, pela história que está por trás deste relacionamento estabelecido entre filhos e progenitores.

Se por outro lado, o comportamento de uma determinada pessoa é para mim fonte de controle aversivo, esta pessoa terá então um valor menor ou nenhum valor, ou seja, minha estima por ela será muito pequena, meu sentimento de afeição por ela será bem diminuto. Como sentimento é comportamento, com pouca frequência demonstrarei minha afeição por esta pessoa, e se o fizer este comportamento não será assim tão intenso como seria com outra pessoa que tenho muita estima. Se assim o fizer a topografia (aparência/forma) do meu comportamento não demonstrará que meu afeto é assim tão intenso. Para entender porque sentimento é comportamento, leia outros posts em que esta questão é desenvolvida, para isso clique aqui.

Então, o leitor já deve ter percebido que o comportamento de estimar está relacionado com aquilo que sinto com relação às pessoas com quem me relaciono. Tem também relação com a forma como percebo as pessoas. Tanto o sentir quanto o perceber, que são comportamentos, são determinados pelas contingências de reforço que se fazem presente nos relacionamentos estabelecidos com as pessoas. Ou seja, o que sinto com relação a uma pessoa é determinado pelos efeitos dos comportamentos dela sobre os meus comportamentos.

Se os efeitos são agradáveis tomo essa pessoa como alguém agradável. Descrevo minha relação com ela como sendo uma relação agradável. Essa descrição é uma regra. Regras são descrições de contingências de reforço, descrições que fazem relação do "se" com o "então". "Se" eu fizer isso "então" acontece aquilo. Se eu me aproximar de "fulano" ele vai me tratar bem, então vou me sentir realizado. Consequentemente criarei circunstâncias que favoreçam o encontro com esse "fulano". Aqui temos a explicação para o comportamento de perceber.

As chamadas "representações mentais" que se formam a partir da percepção, são na verdade regras que descrevem relações do tipo "se"/"então". Não há representações mentais e nem há um processo chamado percepção que aglutina dados sensoriais e forma imagens na mente. Perceber algo é reagir a uma dada circunstância em função dos estímulos presentes nesta circunstância e das consequências gerados pelo nosso comportar-se. Se diz que o artista tem uma percepção mais refinada para arte do que o leigo. O artista tem uma história de reforçamento que modelou comportamentos de discriminar com maior precisão artes deste ou daquele profissional. Ele estudou, se informou, pesquisou, dedicou sua vida às artes, e nada mais natural que reaja a uma tela num museu de uma forma diferente da forma como reagiria o leigo.

O artista seria capaz de dizer que tinta foi usada na tela, quando ela foi pintada e a qual escola artística ela pertence, pois tem em seu repertório comportamentos que o leigo não tem. Não é sua percepção que é diferente, mas sim seu repertório de comportamentos. Sua percepção não tem nada de diferente. Ele simplesmente reage às circunstâncias, às contingências de reforço, pois tem em seu repertório os comportamentos apropriados para reagir de uma forma diferente da forma como reagiria uma pessoa leiga.

Agora aplique tudo que leu acima em si mesmo. Aplicando você entenderá que autoestima é nada mais nada menos do que o comportamento de estimar o próprio valor. Sua autoestima será elevada dependo da forma como se sente com relação a si mesmo e dependendo da forma como se percebe, ou seja, dependendo da forma como descreve a si mesmo. Mas o que sentimentos com relação a nós mesmos e a forma como nos descrevemos é fruto de nossa história.

Alguns aprenderam ao longo da vida que não têm valor nenhum, pois tendo sido mal avaliados por outras pessoas, tomaram a descrição destas como sendo verdadeiras, ou seja, utilizaram estas descrições como regras para descreverem a própria vida. A questão é que estas descrições podem estar erradas. Quando estão erradas geram autoavaliações disfuncionais. Por sua vez, estas avaliações disfuncionais criam circunstâncias aversivas que fazem as pessoas se sentirem mal. Quando se sentem mal dizem que têm uma baixa autoestima. Como mudar este sentimento? Mudando as contingências de reforço.

Uma terapia pode ajudar a pessoa a mudar as contingências que determinam o comportamento de se avaliar de forma tão negativa. O que importa é a pessoa saber o quanto a sua autoavaliação a incomoda. Se houver incômodos é hora de procurar ajuda, pois este incômodo pode gerar interferências em outros comportamentos, tornando, desta forma, a vida menos produtiva. Uma vida menos produtiva pode se tornar escassa em reforçamento positivo. Por sua vez a escassez de reforçamento positivo pode gerar uma série de outros problemas comportamentais (emocionais).

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sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

A Difícil Tarefa de Falar de Sentimentos

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Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Você já percebeu que falar de sentimentos e emoções não é uma tarefa muito fácil? Nós psicólogos vivenciamos isso todos os dias na clínica. Muitos dos nossos clientes querem falar de seus sentimentos, mas as palavras parecem escapar-lhes, e quando alguma palavra é encontrada ela parece não descrever com exatidão aquilo que se sente. No entanto, não é um "privilégio" dos psicólogos poder observar de perto a dificuldade que a maior parte das pessoas têm de falar de seus sentimentos. Aliás, é bom que se diga que os profissionais da psicologia não estão isentos desta dificuldade, afinal de contas nós também somos humanos, e como o resto da humanidade aprendemos a falar de nossos sentimentos com quem não tem acesso ao que estamos sentindo.

Já assinalamos em outros textos que emoções são comportamentos.Tenha acesso a alguns destes textos clicando aqui. O behaviorista não atribui às emoções nenhum status especial. Ele não considera as emoções como os fatores causais daquilo que fazemos. Tanto o que sentimos quanto o que fazemos são comportamentos selecionados (modelados) pelas contingências de reforço que fomos sendo expostos ao longo da vida. Isso não quer dizer que as contingências filogenéticas, aquelas relacionadas à sobrevivência da espécie humana e as contingências culturais não tenham um papel na causação do comportamento emocional.

As contingências filogenéticas selecionaram os comportamentos respondentes que são eliciados quando nos emocionamos. Quando alguém, por exemplo, diz sentir ansiedade, na verdade está relatando algumas transformações fisiológicas que estão se processando no organismo: taquicardia, respiração ofegante, queimação no estômago ou ânsia de vômito, tensão muscular, etc. Estas transformações fisiológicas são os respondentes eliciados quando se sente ansiedade. Isso é apenas parte do comportamento emocional de se sentir ansioso. Outra parte se manifesta através de comportamentos operantes: agitação, fala acelerada, dificuldade de concentração, impaciência, etc.

As transformações fisiológicas foram selecionadas ao longo da evolução das espécies por causa do seu valor de sobrevivência. Imaginemos o caso da ansiedade. Taquicardia e respiração ofegante, por exemplo, ajudam o organismo a entrar num estado de alerta que o prepara para a fuga e contra-ataque. Nos primódios da civilazação humana o Homem disputava alimentos e abrigo com outras espécies, fugir e contra-atacar foram respostas adaptativas selecionadas por contngências filogenéticas. O problema do mundo moderno é que qualquer sinal insignificante de perigo é interpretado como motivo para fugir e contra-atacar, e isso explica porque tantas pessoas têm problemas relacionados com a ansiedade e porque muitas outras vivem explodindo e contra-atacando aquilo que se considera um objeto de temor.

Mesmo os comportamentos de contra-atacar e fugir não são puramente filogenéticos. Há neles um componente operante. Se o contra-ataque minimiza ou elimina os sinais de perigo, acaba por se estabelecer uma contingência de reforçamento negativo. Se a fuga evita danos à integridade física, também se estabelece uma contingência de reforçamento negativo. Mas as respostas de aceleração cardíaca, respiração ofegante, entre outras são puramente filogenéticas, cuja função é colocar o organismo em condições para fuga ou contra-ataque. Neste sentido, podemos dizer que ansiedade enquanto comportamento emocional é um comportamento adaptativo, pois ajudou o homem na luta por alimentos e abrigo.

Mas se a ansiedade como qualquer outro comportamento emocional pode ser um comportamento adaptativo, por que temos padrões emocionais que acabam produzindo problemas, que acabam colocando a integridade do organismo em risco? A resposta está nas contingências de reforço. Se alguém é muito ansioso, pode ser que tenha tido uma história repleta de muitas punições. Sendo assim, vários foram os estímulos que se associaram às punições e por isso se tornaram estímulos aversivos. Então, a pessoa age como se tudo fosse aversivo, como se estivesse prestes a ser punida, por isso precisa manter-se alerta. Uma generalização de estímulos é responsável por este estado de prontidão.

As contingências culturais também têm um papel na causação do comportamento emocional. É dito, por exemplo, que os brasileiros são bastantes expressivos, enquanto que os ingleses são mais frios e introspectivos. Se analisarmos a cultura brasileira encontraremos contingências que favorecem a extroversão, enquanto na Inglaterra encontraremos outras contingências completamente diferentes. Uma análise completa dos comportamentos emocionais também deve levar em consideração estas contingências. Um psicoterapeuta brasileiro atendendo um inglês deve ter o cuidado de não forçar a ocorrência de certos comportamentos emocionais, caso contrário pode criar contingências de controle aversivo que levem o cliente a fugir do tratamento.

Até aqui aprendemos que emoções são comportamentos. Por trás da causação dos comportamentos emocionais estão contingências filogenéticas, contingências de reforço (ontogenéticas) e contingências que envolvem o processo de transmissão da cultura. Resta responder a seguinte pergunta: por que é tão difícil falar de emoções? Lembremos que parte do que ocorre enquanto nos emocionamos são comportamentos respondentes (mudanças fisiológicas). Boa parte destes mudanças geram transformações no interior do organismo, geram estímulos interoceptivos, estímulos que ocorrem no interior do organismo, estímulos que correspondem exatamente aquilo que sentimos quando nos emocionamos.

Estes estímulos são privados, pois só quem tem acesso a eles é aquele que se emociona. Quando descrevemos que estamos sentindo determinada emoção, estamos na verdade descrevendo a ocorrência destes estímulos gerados por comportamentos respondentes. A questão é que aprendemos a descrever tais estímulos, ou descrever nossos estados emocionais com quem  não tem acesso ao que estamos sentindo. Chamamos de comunidade verbal aqueles que nos ensinam tal tarefa. A comunidade verbal é formada por todos os membros que fazem parte dos grupos aos quais frequentamos ao longo da vida: família, escola, grupos sociais, etc.

Se a comunidade verbal não tem acesso ao que sentimos, como ela nos ensina a falar de nossas emoções? Ela faz isso com base em eventos públicos que acompanham nossos estados emocionais. Vamos a um exemplo. Imagine uma criança que ao aprender a dar os seus primeiros passos acaba caindo e ferindo a boca. Imediatamente ela começa a chorar. A mãe presume que ela está sentindo dor e começa a dizer: "oh dó, está doendo bebê? Machucou a boquinha? Fez dodói?" Assim a criança aprende que aquilo que está sendo sentido se chama dor.

Mas não é em todos os estados emocionais que há um evento púbico claro acompanhando um estímulo privado que se presume estar ocorrendo. A comunidade verbal vai sempre inferir a presença de um estímulo privado a partir de eventos públicos correlatos, mas estes últimos nem sempre são assim tão evidentes. Deste fato deriva-se a dificuldade que geralmente temos em falar de emoções, pois aprendemos a relatá-las de modo bastante impreciso, e toda imprecisão decorre do acesso que a comunidade não tem aos estímulos que se originam da ocorrência de comportamentos respondentes.


Este é um dos principais motivos que explicam a dificuldade que todos temos em falar de emoções. Há outros. Emoções que geram estimulação aversiva também vão ser relatadas com dificuldades, pois os estímulos aversivos irão gerar comportamentos que concorrerão com o comportamento de relatar a emoção sentida. Pessoas com pouco treino em habilidades sociais também podem sentir muita dificuldade ao falar de emoções, pois o falar pressupõe um ouvinte (plateia), e a ausência de comportamentos que permitam a socialização transforma as situações sociais em fontes de estímulos aversivos.

Portanto, antes de julgarmos alguém, é bom que nos questionemos se estamos em condições de descrever o que a pessoa está sentindo. Nem sempre os eventos públicos que acompanham os comportamentos emocionais são pistas confiáveis para aquilo que as pessoas estão sentindo. Ao lembrarmos disso evitamos os riscos de chegarmos a conclusões precipitadas a respeito daquilo que as pessoas sentem.

E você, o que achou deste texto? Manifeste sua opinião.

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quarta-feira, 14 de novembro de 2012

O Amor e os Seus Mitos

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Novamente o amor é tema do blog Café com Ciência. O poder do amor, ou melhor dizendo, o poder que o comportamento de amar tem de produzir contextos (estímulos discriminativos) e de gerar estímulos reforçadores que respectivamente produzem disposições para agir de determinada forma, como também reforçam tais disposições, é o motivo pelo qual este sentimento, ou esta forma de se comportar ter sido tão retratada ao longo da história da humanidade em pinturas, poemas, histórias, novelas etc.

O amor exerce um grande fascínio sobre aqueles que amam. E o motivo não é muito difícil de entender. Quem ama se mobiliza para fazer com que o amor se transforme no tema central de sua vida. Se mobiliza porque o amor tem o poder de gerar estímulos reforçadores os mais diversos, inclusive e principalmente estímulos de natureza sexual. Não me refiro ao sexo propriamente dito. Um beijo, é por exemplo, um reforço de natureza sexual, pois deriva seu poder de reforçar da sua capacidade de estimular sensorialmente os lábios, e tal estimulação naturalmente vai provocar (eliciar) comportamentos reflexos (mudanças fisiológicas) descritas como prazer.

Logicamente que o poder do beijo de reforçar não advém apenas da seleção natural, da filogênese. Ele depende também da cultura. Em nossa cultura o beijo é uma espécie de rito de iniciação à vida sexual. Está associado à conquista e ao cortejo. Culturalmente o beijo é uma espécie de objeto de desejo, primeiro passo que sucede a tantos outros que podem levar a obtenção de prazer sexual. Filmes e novelas transformam o beijo em uma grande encenação teatral, e sendo dramatizado de tal forma passa a ser objeto de desejo das massas. Então, as contingências culturais também têm um papel na determinação do poder reforçador de um beijo ou mesmo de qualquer outro gesto de carinho.

Beijos e gestos de carinho são comportamentos através do qual o amor é expressado. Tais comportamentos geram disposições comportamentais no(a) parceiro(a), como também podem reforçar estas disposições. Dito isso, entedemos porque o amor exerce um fascínio tão grande sobre aqueles que amam, ou seja, isso acontece por causa do poder que o amor tem de produzir reforços, reforços que modelam os mais diversos tipos de comportamentos, reforços que derivam sua força da seleção natural e de contingências culturais. Em função disso muito já se disse sobre o amor ao longo da história, aliás, por causa disso muito ainda se diz a respeito do amor. Mas muito do que se diz sobre o amor são mitos e lendas. Gostaria de enumerar pelo menos dois destes mitos, e farei isso através de alguns questionamentos.

Só se ama uma vez? Quem leu o post "Uma Análise Comportamental da Dor de Amor" sabe que essa pergunta não pode ter um "sim" como resposta. O motivo é simples. Emoção é comportamento. O amor é uma emoção, logo é comportamento. Como comportamento ele está sujeito aos efeitos das consequências que produz, quanto do contexto em que ocorre. Em outros dizeres, o comportamento de amar está sujeito a ação das contingências de reforço, como também das contingências da seleção natural e das contingências culturais como já assinalado. Sendo assim, alguém pode deixar de amar uma pessoa, mas isso não quer dizer que ela perca a capacidade de amar, ou seja, isso não quer dizer que ela não pode voltar a amar uma outra vez.

Essa conversa de que só se ama uma vez é mito. Quando um relacionamento termina, quando um amor se acaba, os comportamentos de amar o(a) parceiro(a) entram em extinção. Expliquei esse processo com detalhes no texto "Uma Análise Comportamental da Dor de Amor", texto ao qual já fiz referência. Aconselho que leitor dê uma olhadinha neste texto. O que ocorre, então, é que se deixa de amar o(a) parceiro(a), ou seja, os comportamentos de amar direcionados aquela pessoa entram em extinção. Isso não quer dizer que o repertório total dos comportamentos que compõem a classe de comportamentos de amar sofra uma completa extinção.

A fila anda, e em nova ocasião pode aparecer um parceiro diferente que ofereça reforçadores bastante distintos, e isso é suficiente para que o comportamento de amar esse novo parceiro seja modelado e passe a fazer parte do repertório de comportamentos de amar. O que pode ocorrer é que a pessoa traga marcas do relacionamento anterior que interfiram no novo relacionamento. Em outras palavras, ela pode trazer disposições comportamentais modeladas por outros relacionamentos, e estas disposições acabam ocasionando problemas para o novo relacionamento. Mas isso não ocorre porque a pessoa perdeu sua capacidade de amar, mas sim por causa de eventos que no passado geraram disposições comportamentais com potencial para produzir problemas os mais diversos quando novos relacionamentos são estabelecidos. Sendo assim, consideremos derrubado o primeiro mito a respeito do amor: "só se ama uma vez".

Depois que deixamos de amar uma pessoa, podemos voltar a amá-la? Sim, nós podemos, embora, essa não seja uma tarefa muito fácil, porque quando se deixa de amar geralmente se cria aversão. Aquele que era objeto de amor muitas vezes acaba se transformando em objeto de outros sentimentos como a raiva, ou seja, aquele que era uma potencial fonte de reforços se transforma em uma fonte de estímulos aversivos, provocando repulsa (comportamento de fuga/esquiva). Nem sempre esse é o caso, mas muitas vezes acontece, principalmente quando o relacionamento termina de forma traumática.

Podemos voltar a amar alguém que se deixou de amar, bastando para isso identificar no relacionamento fontes de reforçamento que não foram exploradas. Estas novas fontes de reforçamento podem criar contextos que voltem a suscitar o comportamento de amar, de modo que este comportamento tenha a oportunidade de ser novamente reforçado. Com isso novas interações são criadas entre o casal, e estas novas interações produzem novos reforços. Por sua vez os novos reforços vão fortalecer o laço de amor entre o casal, ou seja, vão fortalecer as disposições de demonstrar amor entre os parceiros.  Fica derrubado, portanto, o segundo mito.

Poderia aqui explorar tantos outros mitos, mas estes dois nos dão uma dimensão do quão complexos são os comportamentos que envolvem as expressões de amor. Mas importante é saber que o amor é comportamento, e que comportamento pode ser modelado. Se pode ser modelado, relações podem ser refeitas. Importante é saber que as respostas para o amor e suas frustrações estão nas contingências de reforço. Uma vez analisadas as contingências podem nos revelar muito sobre os nossos sentimentos, inclusive sobre o amor.

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quinta-feira, 4 de outubro de 2012

Uma Análise Comportamental da Dor de Amor

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Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Ahhhh, o amor... Nobre sentimento que inspirou pelos séculos os poetas e artistas. Quantas pinturas não foram feitas para expressar um amor? Quantos poemas não foram escritos por amor? Queria muito nesta postagem tratar deste tema sem recorrer à ciência, pois a ciência parece fria, distante, e aparentemente o que ela teria a dizer sobre o amor? Bem, ela tem muita coisa, principalmente a ciência do comportamento, ciência que tem o Behaviorismo Radical como seu fundamento filosófico.

O amor tem um grande poder. Como estímulo reforçador ele pode modelar os mais diferentes comportamentos. Uma pessoa apaixonada escreve cartas de amor, manda ao longo do dia mensagens de sms para expressar o seu querer, posta no facebook imagens e mensagens para tornar público sua alegria de amar. Ahhh, eu não poderia deixar de citar os "sms's" e o "facebook", pois em pleno século XXI o amor encontra nestes meios as suas formas de expressão... Rs!!! É a modernidade atualizando os meios para se expressar o amor.

Amor é comportamento! Sim, é comportamento. Sei que parece esquisito, mas amor é comportamento emocional sujeito a ação das consequências que produz. Um(a) amante expressa seu amor pela(o) amada(o) através do facebook, orkut (morto ou não?! Rs...), twitter, youtube etc, porque desta forma obtém a atenção e as carícias da(o) parceira(o). Vejam, então, o condicionamento operante de fato operando... O comportamento opera no ambiente modificando-o e é ao mesmo tempo modificado, ou seja, o amado que manifesta seu amor modifica o ambiente ao aumentar a probabilidade de que a amada responda satisfatoriamente com carícias e juras de amor.

O amado faz isso com seus próprios comportamentos, como os já citados: postando no facebook, usando sms, etc. Estes comportamentos geram estímulos que aumentam a probabilidade da amada agir de forma a reforçar o que o amado faz e vice-versa. Assim o amor enquanto comportamento vai sendo fortalecido, de modo que sua frequência de emissão vai aumentando. Mas, como "nem tudo são flores", o amor também enfrenta problemas, e isso os poetas sabem muito bem, tanto que Camões assim descreveu este nobre sentimento (compotamento): "Amor é fogo que arde sem se ver; / É ferida que dói e não se sente; / É dor que desatina sem doer."

O amor "é dor que desatina sem doer". Quem já amou e perdeu um amor sabe o que é isso! A dor da perda de um amor costuma se manifestar por comportamentos respondentes bastante distintos: ansiedade com aquela pontada no coração, o que faz parecer que o coração é o reduto do amor; estômago nauseado; rigidez muscular, etc. Quando se ama alguns comportamentos reflexos ficam sob o controle dos estímulos gerados pelo comportamento da pessoa que se ama. Ao se perder quem se ama, perde-se algo importante, o que produz controle aversivo, ou seja, quem perde um amor diz que a perda dói, e isso acontece porque a perda produz punição (controle aversivo). Punição produz todos estes estados emocionais colaterais, que são na verdade exemplos de comportamentos reflexos.

Mas a perda de um amor também é ocasião para a emissão de muitos comportamentos operantes. Quem já perdeu um amor, provavelmente nos primeiros dias e semanas sentiu a todo instante uma vontade de estar com a(o) amada(o), ouviu músicas que lembravam o amor perdido, ensaiou pegar o telefone várias vezes para ouvir a voz daquele(a) que era a fonte de todo o amor, chorou, falou da pessoa perdida para todo mundo, etc. Essa é uma experiência universal para o fim de todos os amores.

É universal porque o que ocorre quando se perde um amor é que todos os comportamentos que antes eram dirigidos à pessoa amada começam a entrar em extinção. Todo comportamento quando emitido e não reforçado entra em extinção, ou seja, começa a perder sua força até voltar ao que era antes de ser modelado, de ser fortalecido pelos diversos reforços que o seguiram. Mas no início do processo de extinção os comportamentos ao invés de declinarem aumentam de frequência. Por isso no início da perda de um amor se pensa tanto em quem se perdeu, se ensaia ligar para o(a) amado(a) que se foi, são ouvidas músicas que lembram os velhos tempos, etc.

Todavia, a cada ocorrência destes comportamentos, se eles não são reforçados, acabam se enfraquecendo, até desaparecerem. Então, caro leitor, não se assuste se no início da perda de um amor você se ocupa apenas do amor perdido. Não se preocupe, pois cada vez que se engajar nestes comportamentos e eles não forem reforçados, inevitavelmente entrarão em extinção. Ou seja, a dor acaba passando. Lógico que ela passa mais fácil se você se engajar em outros comportamentos que sejam capazes de produzirem reforços que substituam aqueles que eram gerados pelos comportamentos da pessoa amada.

Não necessariamente você precisa entrar numa nova relação imediatamente, pois isso nem sempre ajuda. Quando falo de reforços que possam substituir àqueles gerados pelo amor que foi perdido, me refiro aos reforços que podem surgirem como consequências de você se expor a novas contingências de reforço, contingências que podem ser experimentadas em atividades como lazer, uma boa leitura, um bom filme, um papo com os amigos, uma atividade esportiva, etc. Se expor a novas contingências é o melhor remédio! Tente e depois me diga.

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terça-feira, 31 de julho de 2012

Pular, pular: se expondo a novas experiências

 

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Se não conseguir assistir o vídeo clique no seguinte link para assisti-lo no YouTube: http://www.youtube.com/watch?v=9n-heE1F5Wo

Se você viu o vídeo acima deve ter percebido como às vezes a vida dá reviravoltas, e estas reviravoltas criam circunstâncias favoráveis para que possamos viver novas experiências, e com a vivência de novas experiências temos a oportunidade de experimentarmos novos sentimentos. Simples assim! Simples como dizer "oi". Não resisti ao jargão de certa operadora de celular! Rsrsrsrs...

O vídeo mostra um cordeiro que muito orgulhoso de sua felpuda lã, já ao raiar do dia começava a sapatear. Com isso chamava a atenção dos bichos que moravam nas circunvizinhanças. Todos ficavam impressionados com o sapateado do cordeiro, e logicamente direcionavam toda sua atenção para ele. Ops, aqui se vê em vigor uma operação de reforçamento positivo. O sapatear tinha como consequência obter atenção dos vizinhos. Quanto mais davam atenção, mais o cordeiro sapateava e mais se sentia orgulhoso.

Isso levou o cordeiro a formular uma regra para descrever as contingências de reforço as quais estava exposto. Falando menos tecnicamente, isso levou o cordeiro a formular uma regra de conduta. Esta regra o fazia entender que o que chamava atenção da bicharada era sua felpuda lã, e sapatear era uma forma de exibir o seu visual, ou seja, para o cordeiro o motivo para continuar sapateando era poder exibir sua lã, tanto é verdade que quando foi tosqueado ele perdeu toda a motivação para sapatear.

Está certo que a lã poderia exercer certo fascínio sobre o comportamento de observar e dar atenção da bicharada, mas este fascínio também era obtido pelo sapatear do cordeiro, tanto é verdade que os bichos imitavam-no e com ele sapateavam. A lã era um elemento a mais, um estímulo que contribuía para que a contingência de reforço fosse potencializada, ou seja, era uma espécie de "plus" que somado ao sapateado tornava a circunstância mais atraente, mas não era ela o elemento mais importante, caso contrário os bichos não imitariam o comportamento de sapatear, ficando apenas a observar a beleza do cordeiro.

O sapatear dos bichos é um indicativo de que o sapatear do cordeiro era o estímulo mais importante da contingência, ou seja, era o elemento mais importante daquela circunstância. Outro indicativo é que posteriormente o cordeiro conseguiu obter a atenção dos bichos com o comportamento de pular aprendido com o "coelho". Depois da aprendizagem do comportamento de pular a lã já não era mais importante, pois o cordeiro aprendeu obter reforço positivo (atenção dos bichos) através do pular, tanto não era importante que o cordeiro não mais se importava em ser tosqueado.

O cordeiro aprendeu a obter a atenção dos que estavam próximos com aquilo que ele era e não com aquilo que aparentava. A aparência ficou em segundo plano. O comportamento de pular se tornou intrinsicamente reforçador, ou seja, transformou-se em uma fonte de prazer, seja pela estimulação sensorial produzida, seja pela capacidade de conseguir atenção. As novas circunstâncias vividas a partir do encontro com o "coelho" geraram uma nova aprendizagem que se transformou em uma nova regra de conduta, e esta pode ser assim traduzida: agora o que importa é ser feliz independente da aparência.

O cordeiro aprendeu que o importante era ser feliz com aquilo que ele sabia fazer, ou seja, que sua felicidade dependia do seu agir no mundo e não de sua aparência. Mas tudo isso só foi possível porque ele foi exposto a novas contingências de reforço, ou em outras palavras, porque ele se permitiu viver novas experiências. Ao viver novas experiências acabou experimentando novos sentimentos que se sobrepuseram àqueles sentimentos gerados quando do primeiro tosqueamento.

O primeiro tosqueamento gerou perda de reforçamento positivo. Com isso o cordeiro fechou-se em si mesmo, ou seja, todos seus comportamentos de extroversão foram submetidos a extinção. Com a extinção surgiram sentimentos como tristeza, angústia etc. Digamos que se analisássemos o comportamento do cordeiro a partir de sua aparência (topografia), não teríamos dificuldades para rotulá-lo como "depressivo". Mas a partir de uma análise funcional descreveríamos os sentimentos vividos pelo cordeiro como consequência do processo de extinção de alguns de seus comportamentos.

Portanto, a história nos deixa uma lição. Que lição é essa? Devemos continuamente nos darmos a oportunidade de vivermos novas experiências. Se quisermos mudar nossos sentimentos, só conseguiremos esta façanha mudando as circunstâncias responsáveis pela ocorrência dos mesmos. O cordeiro teve seus sentimentos mudados porque mudaram também as circunstâncias  responsáveis por estes sentimentos. Sentimentos não são causas de comportamento. Sentimentos são comportamentos também, sendo, portanto, determinados pelas contingências de reforço, e só quando estas se alteram é que os comportamentos se modificam, inclusive os comportamentos emocionais.

Uma outra lição interessante é que nossa felicidade não depende exclusivamente de nossa aparência. O mundo capitalista que vivemos quer nos fazer acreditar nesta verdade para vender cosméticos e outras tantas mercadorias. Há inclusive milhares de pessoas que se tornam reféns dos padrões de beleza estabelecidos pela mídia, dependência que gera contingências de reforço que produzem sofrimento e desajustamentos, desajustamentos que às vezes chegam a extremos como os da Anorexia e Bulimia Nervosa.

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