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quarta-feira, 25 de abril de 2012

Planejamento e Política Pública: uma pequena amostra do caso brasileiro

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Um dos elementos que aumentam a margem de sucesso de uma política pública é o planejamento. É o planejamento que confere à política a racionalidade necessária para que os recursos investidos em sua implementação sejam bem utilizados, e a isso dá-se o nome de otimização ou racionalização da gestão. O que são políticas públicas? Políticas públicas são ações continuadas por porte do Estado que têm como objetivo o atendimento às necessidades da coletividade.


Formula-se uma política porque existem problemas a serem resolvidos. Existem políticas de saúde porque existem problemas de saúde a serem tratados e/ou prevenidos. Existem políticas de educação porque existem problemas educacionais a serem tratados e/ou porque a educação é um meio privilegiado para permitir o acesso a conhecimento, e por sua vez conhecimento pode ser utilizado para a transformação da realidade. Se a educação pública permite ou não a aquisição de conhecimentos úteis a transformação da realidade já é uma outra questão. E a serviço de quem a educação pública está é ainda uma outra questão. Ela está a serviço do cidadão para torná-lo mais consciente da importância do seu papel enquanto agente transformador, agente produtor de história, ou a serviço da ideologia das classes dominantes? Ideologia pode aqui ser entendida como o conjunto total de comportamentos que geram estímulos que criam a oportunidade de modelagem de comportamentos que não exerçam nenhum ou pouco contracontrole sobre os detentores do poder, sobre os detentores dos principais reforços que controlam as contingências responsáveis pelo funcionamento da economia, sistema político, sistema judiciário etc.

Ideologias se traduzem por descrições não oficiais de contingências de reforço. Estas descrições geram regras que controlam o comportar-se, mesmo que não sejam regras oficiais, regras reconhecidas pelo sistema judiciário. Embora não estejam codificadas por meio de leis, ou seja, embora não sejam oficialmente reconhecidas, acabam se transformando em códigos de condutas, em contingências de reforço que fazem parte da cultura de um povo, contingências que acabam modelando comportamentos que mantêm e preservam esta cultura, ainda que ela possa não produzir benefícios significativos para este povo. Mas para este povo perceber que as ideologias que reproduzem não os beneficiam, precisam adquirir conhecimentos que permitam que se conscientizem a este respeito, ou seja, é necessário que existam contingências que gerem comportamentos verbais que permitam descrever as circunstâncias que produzem as ideologias e como elas afetam o comportamento das pessoas inseridas numa determinada coletividade. Não estou certo se nosso sistema educacional modele comportamentos neste sentido, ou seja, no sentido de tornar as pessoas mais “conscientes” de suas realidades.

                                                         Ideologia

Já que estamos falando de ideologias e mencionamos que elas se traduzem por códigos de condutas não oficializados, e já que estamos também discorrendo um pouco sobre políticas públicas, seria oportuno mencionar que existe um código de condutas não oficial no Brasil quando o que está em jogo é o planejamento de políticas públicas. Infelizmente planejamento não é algo inerente ao processo de elaboração e implementação de políticas públicas no Brasil. A quem a ausência de planejamento beneficia? Boa pergunta... O código de conduta que diz “veladamente” que não é necessário planejar, pois no fim tudo se acerta, gera que tipo de produtos? Certamente gera desperdício de recursos públicos. O desperdício produz aumento na tributação, pois o dinheiro precisa sair de algum lugar para cobrir os rombos gerados por recursos subaproveitados ou mal aproveitados. Quem paga por isso é o bolso do contribuinte.

Já falei em outro post sobre a cultura do “jeitinho brasileiro”. Este comportamento de que no fim tudo se acerta gera produtos nefastos para toda a coletividade. Todos pagamos por adiarmos a resolução de problemas coletivos que afetam a vida de todos individualmente. Então, planejar políticas públicas é pensar nas contingências de reforço através dos quais estas políticas contribuirão para a geração de comportamentos que possam beneficiar toda coletividade, que possam aumentar as chances de sobrevivência da cultura e também da espécie humana, pois se não nos preocuparmos em modelar comportamentos que beneficiem a todos a sobrevivência da humanidade estará em risco. Um exemplo simples é a cultura do consumismo desenfreado.

Consumismo desenfreado leva a explorações indevidas do meio ambiente. Esta exploração gera depredação ambiental. Por sua vez, esta depredação altera o clima, o regime de chuvas, a temperatura global, produz novas doenças etc. Tudo isso a longo prazo produzirá circunstâncias que dificultarão a sobrevivência da espécie. Pensar em alternativas para o consumismo é pensar no benefício de toda a coletividade. A reciclagem é o exemplo de política pública que precisa de mais planejamento e investimento, sob pena de esgotarmos os recursos naturais essenciais a nossa sobrevivência como espécie. Mas, podemos contar nos dedos os municípios brasileiros que contam com um aterro sanitário e uma usina de reciclagem. É mais barato investir num aterro sanitário e numa usina de reciclagem do que posteriormente gastar recursos tentando consertar os danos gerados por lixões e por enchentes provocadas por bueiros entupidos com sacolas e garrafas plásticas.


No entanto, planejamento é algo que falta à política brasileira. Vejam um exemplo que ocorreu na Paraíba (clique aqui para ver). Para ajudar agricultores deste estado o governo nacional destinou para eles sementes para o cultivo das lavouras. Todavia, os agricultores recusaram as sementes, pois estas não eram apropriadas para o clima e tipo de solo da região. Não era uma questão de planejamento? Antes de destinar as sementes o governo não tinha que se questionar se elas eram ou não apropriadas? Cadê o planejamento que deveria fundamentar as políticas de agricultura? O Ministério da Agricultura não tinha que ter uma espécie de diagnóstico (mapeamento) dos tipos de solo e clima de cada região do país, de modo que qualquer decisão sobre o fornecimento de insumos para lavouras fosse tomada com base nestas informações? Pergunta-se: quanto se desperdiça de recursos num pequeno erro como este? Desperdiça-se tempo, combustível para transporte dos insumos etc.

Se este tipo de erro grotesco ocorre com políticas voltadas para a agricultura, o que esperar de políticas como saúde, educação, assistência social, urbanismo etc? Todo este problema poderia ser contornado se as políticas públicas neste país fossem elaboradas com base em diagnósticos que fornecessem informações sobre os fenômenos que se processam na realidade social. Em outras palavras, tudo isso poderia ser evitado se houvesse planejamento, se fosse refletido que contingências de reforço as políticas públicas devem produzir para modelar comportamentos que beneficiem toda coletividade, pois se são mesmo públicas, as políticas devem estar voltadas para o povo e não para os interesses escusos das classes dominantes, para a manutenção de um sistema político que legisla para manter suas próprias regalias.

Experimentação social é a saída, e neste sentido a Análise do Comportamento, ciência que estuda o comportamento e suas leis, tem muito a oferecer. Experimentos pilotos poderiam ajudar na decisão sobre o melhor rumo que uma política deve seguir. Skinner nos dá o exemplo em Walden II, um romance que fala de uma comunidade regida de acordo com os princípios da Análise Experimental do Comportamento, uma comunidade que tem como principal critério de funcionamento a sobrevivência da própria comunidade e também da espécie humana, e se este é o principal critério, ficam excluídas, portanto, as possibilidades de existirem circunstâncias que possam privilegiar mais a alguns grupos do que outros. É um livro que vale a pena ser lido. Fica, então, a dica de leitura para quem quiser aprofundar no assunto.

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domingo, 15 de abril de 2012

Jovem "puxa gato" e morre eletrocutado: reflexões sobre o jeitinho brasileiro

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Neste domingo 15 de abril de 2012 um jovem de 14 anos morreu eletrocutado depois de tentar “puxar um gato” da rede elétrica em Esmeraldas, cidade situada na região metropolitana de Belo Horizonte. Clique aqui para ver reportagem. Certamente o que o jovem estava fazendo é um crime. Não sei nada sobre direito, mas imagino que deve existir algum tipo de punição para estes casos, principalmente porque a parte lesada seria a poderosa CEMIG.


Cabe uma análise da situação? Sim, certamente. Tentemos imaginar porque um jovem de 14 anos estava roubando energia da rede elétrica. Poderíamos levantar várias hipóteses. Uma hipótese plausível é o famoso “jeitinho brasileiro”. Brasileiro tem um jeito para todo tipo de situação. Este é um comportamento que é parte da cultura do nosso país. Ser brasileiro quase que virou sinônimo de fazer de tudo para dar jeito em qualquer tipo de situação. Ser brasileiro é praticamente sinônimo de tirar alguma vantagem em cima dos outros.

E a mídia reforça bastante este tipo de comportamento chamando-nos de guerreiros para que compremos cerveja, para que nos sintamos mobilizados a deixar em dia nosso título de eleitor, blá, blá, blá etc e tal. Fico aqui pensando com os meus botões se os maiores interessados neste padrão comportamental não são nossos políticos corruptos. Se tudo pode ser feito para tirar vantagem, não há problema algum em desviar alguns milhões de recursos públicos para a própria conta em paraísos fiscais.

Talvez queiram banalizar a cultura do “jeitinho brasileiro” para que tudo que se faça seja aceitável, inclusive o desvio de alguns milhões de recursos públicos que quando desviados deixam de serem investidos na saúde, educação, lazer, pesquisas científicas etc. Uma vez que acreditemos que é normal tirar vantagem em cima do outro, passamos a aceitar quase qualquer tipo de situação sem muita indignação. Assim criam-se contingências que diminuem a probabilidade de comportamentos de contracontrole, fazendo com que sejamos bons cordeirinhos e não nos rebelemos contra o cabresto que nos é imposto.

Tomando a cultura do “jeitinho brasileiro” como normal, deixamos inclusive de nos rebelarmos contra uma CEMIG que tem a tarifa de energia mais cara do país. Aceitamos sem muita rebeldia as tarifas que nos são impostas. Os que não aceitam tentam “puxar um gato” arriscando a própria vida. Então outra hipótese plausível para o comportamento de “puxar um gato” é que este é uma forma de contracontrole, de roubar de quem rouba primeiro, neste caso quem rouba primeiro é a concessionária de energia, que recebe todo o respaldo do governo do estado para nos assaltar com suas tarifas exorbitantes. Mas este é um comportamento de contracontrole -  comportamento que tenta eliminar uma fonte de estimulação aversiva - pouco efetivo, pois, além de colocar a vida em risco pode ser enquadrado como crime. Além do mais não contribui para a mudança das contingências de reforço, de modo que possam ocorrer alterações na legislação, alterações que poderiam modificar a tarifação de energia e outros serviços públicos.

Fica a pergunta: ao acreditarmos na “normalidade” do “jeitinho brasileiro” quem acaba saindo perdendo?

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