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segunda-feira, 22 de abril de 2013

Laranja Mecânica: uma análise comportamental

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

O filme Laranja Mecânica conta a história de Alex, um jovem inglês que é líder de um grupo de deliquentes que cometem todos os tipos de horrores durante as madrugadas: espancamentos, brigas com grupos rivais, assaltos, estupros e até mesmo assassinato. Numa das investidas realizada pelo grupo durante uma madrugada, os companheiros de Alex armam contra ele, pois estavam cansados de sua liderança autoritária. Como o grupo só conhece a agressão, usam-na para dar uma lição em Alex.

Num assalto realizado em um hotel fazenda, Alex acaba assassinando a proprietária do hotel. Os companheiros de gangue atinjem-no com algumas garrafas de leite na cabeça, deixando-o inconsciente e transformando-o em um alvo fácil para a polícia que já havia sido acionada. Por ironia do destino a violência de Alex acaba se voltando contra ele, pois os liderados se rebelam e o destituem do poder usando os mesmos métodos coercitivos. Enfim, coerção gera coerção, e o filme Laranja Mecânica é muito claro neste sentido, pois elucida de maneira bastante óbvia os efeitos colaterais gerados pela utilização de controle coercitivo.

Tais efeitos se fazem evidente no tratamento que Alex é submetido depois que é levado para a prisão. Tendo recebido uma pena de 14 anos de reclusão em um instituto prisional que usa a coerção para manter sob controle os detentos, Alex enxerga num tratamento revolucionário a possibilidade de encurtar o cumprimento de sua pena. Trata-se de um tratamento que ilustra com bastante clareza o paradigma do condicionamento respondente, ao mesmo tempo que cria a oportunidade para que possamos discutir a eficácia da punição como meio para a modificação de comportamentos.

Por possuir um perfil bastante agressivo Alex é escolhido para ser submetido ao tratamento, sendo, então, transferido para uma clínica em que é colocado sob os cuidados de uma equipe médica. O tratamento consiste em assistir filmes com cenas explícitas de violência enquanto um medicamento que provoca uma terrível sensação de náusea é administrado. Veja o esquema abaixo:

Veja a semelhança com o experimento realizado por Pavlov no estudo do condicionamento respondente:
No experimento de Pavlov o estímulo incondicionado, ou seja, o estímulo que provoca a resposta reflexa de salivação, uma resposta que ocorre sem a necessidade de aprendizagem, é a comida. No experimento realizado com Alex o medicamento cumpre a função de estímulo incondicionado. Após a associação temporal entre o alimento e a campainha no arranjo experimental construído por Pavlov, o som passou a adquirir a função de estímulo condicionado, provocando, desta forma,  a resposta de salivação quando apresentado. Já na experiência ao qual Alex foi submetido, as cenas de violência exibidas nos filmes que ele foi obrigado a assistir, adquiriram a função de provocarem a resposta reflexa de náusea, ou seja, adquiriram a função de estímulos condicionados. Para maiores detalhes sobre o condicionamento respondente, é interessante ler outro artigo deste blog intitulado: "O condicionamento respondente: definição e aplicações."

Era esperado com a realização do tratamento que Alex se sentisse mal todas as vezes que se engajasse em um comportamento violento. E de fato isso aconteceu. Depois de sair da prisão Alex se sente mal em inúmeras oportunidades em que tem a chance de se engajar em comportamento violento ou quando presencia alguma cena de violência. As fortes sensações de náusea sentidas por Alex o incapacitavam de cometer atos de violência. Enquanto estava ocupado sentindo náuseas ele não podia se engajar em comportamentos violentos. Trata-se aqui de incompatibilidades entre comportamentos do mesmo repertório comportamental, e venciam aqueles comportamentos que tinham maior força. No caso de Alex, venciam as náuseas, e para se esquivar de senti-las era necessário não cometer nenhuma violência.

Na história de Alex também é possível ver operar o reforçamento negativo. Engajar-se em atos de evitação da violência permitia que as punições fossem evitadas. As respostas reflexas sentidas como náuseas eram ao mesmo tempo um exemplo de comportamento respondente eliciado por cenas de violência, como eram também a consequência de comportamentos que tinham como objetivo a prática de ações violentas. As náuseas puniam os comportamentos de cometer violência, impedindo-os de acontecerem enquanto o estímulo aversivo "enjoos" estivesse operando. Em última instância, o corpo e os comportamentos de Alex eram suas fontes de punição. Ele não podia fugir de si mesmo, então, o melhor seria esquivar-se da violência. O esquema abaixo sintetiza a análise dos operantes de Alex:


Mas como era de se esperar o tratamento teve alcance limitado, pois logo as respostas reflexas de náusea foram se extinguindo, e as cenas de violência que sinalizavam a possibilidade de punição acabam perdendo esta função de sinalização, ou seja, perdem a função de serem estímlos discriminativos que sinalizam a ocorrência de punições. Se tais cenas perdem a função de estímulos condicionados no eliciamento das respostas reflexas de náusea, os comportamentos de violência têm a chance de ocorrerem sem serem punidos, pois também perdem a função de eliciarem as sensações de desconforto que atuavam como punição. Esta é uma questão clássica, ou seja, estímulos aversivos condicionados vez ou outra precisam ser pareados com o estímulo punidor incondicionado, caso contrário perdem a função de punidores ou de sinalizadores de punição.

No caso de Alex, seus comportamentos de cometer violência eram ao mesmo tempo estímulos condicionados para as respostas reflexas de náusea, sinalizadores de ocorrência da punição (náusea) e também eram punidores e geradores da punição que era sentida com o grande desconforto que acompanhava as crises de náusea. Quando é desfeito o condicionamento respondente, ou seja, quando as cenas de violência e os comportamentos de se engajar em violência perdem a função de eliciarem as respostas reflexas de náusea, os comportamentos violentos perdem também a função de punidores e sinalizadores de punição, ao mesmo tempo em que cometer violência deixa de ser punido pela ocorrência dos desconfortos. Neste sentido, o filme evidencia duas coisas muito importantes: 1) Um programa de modificação de comportamentos não deve se limitar à ocorrência dos comportamentos respondentes e nem deve 2) fazer uso de punição. A punição tem efeitos colaterais nocivos, e a sua eficácia em suprimir comportamentos dura enquanto o estímulo aversivo estiver presente. Além do mais, os estímulos aversivos condicionados precisam ser pareados habitualmente com estímulos aversivos incondicionados para não perderem a função de punidores.

Um pai que ameaça o filho com uma chinela nas mãos, vez ou outra precisa dar uma chinelada para que a chinela continue funcionando como estímulo sinalizador de punição ou ainda como estímulo punidor. Mas este mesmo pai ao usar de punição está sujeito aos efeitos colaterais que ela gera: contracontrole, ansiedade, medo, submissão etc. No caso de Alex, para que as náuseas continuassem funcionando como punição para os comportamentos de se engajar em violência, as cenas de violência teriam que ser pareadas ocasionalmente com a medicação, ou seja, ele teria que ser submetido de vez em quando a novas sessões do tratamento. Mas os efeitos do tratamento foram terríveis, pois transformaram Alex em um sujeito submisso e temeroso dos desconfortos que podiam ser sentidos a qualquer instante.

Melhor seria se Alex tivesse a oportunidade de acessar fontes de reforçamento positivo todas as vezes em que se engajasse em comportamentos mais funcionais. Aí estaríamos falando de um programa de modificação de comportamentos que também contemplaria a análise funcional dos operantes de cometer violência, ou seja, que contemplaria a função exercida por tais comportamentos, um programa que fosse capaz de analisar as variáveis responsáveis pela manutenção dos comportamentos violentos, e que não se limitasse somente a aplicação de técnicas de condicionamento respondente, que acima de tudo foram altamente intrusivas e tiveram resultados questionáveis, pois fizeram utilização de controle coercitivo. 

Se o filme ilustra bem o paradigma do condicionamento respondente e os efeitos nocivos da utilização do
controle aversivo, ele não serve para ilustrar a proposta da Análise do Comportamento e de sua filosofia, o Behaviorismo Radical. A Análise do Comportamento não defende o uso do controle aversivo, pois este tipo de controle tem consequências bastante nocivas. A respeito do controle comportamental, é sugerido o seguinte texto: "Controle Comportamental: algumas considerações". A Análise do Comportamento estuda o controle aversivo como forma de demonstrar as consequências que ele produz, e como forma de demonstrar que há outras alternativas muito mais viáveis. Um bom programa de modificação de comportamentos envolve a análise funcional dos comportamentos que se quer modificar e não somente a aplicação de técnicas para modificações comportamentais. Para aprofundar nesta questão, aconselho a leitura do seguinte texto deste blog: "Por que a Terapia Comportamental é Comportamental?".

Voltemos ao filme. Como no experimento de Pavlov em que o som perdeu a função de eliciar a resposta reflexa de salivação ao ser apresentado sozinho, ou seja, ao ser apresentado sem que fosse pareado com a alimentação, as cenas de violência deixaram de eliciar as respostas reflexas de náusea quando o pareamento entre elas e a medicação foi rompido. Ocorreu, então, uma extinção das respostas reflexas condicionadas de náusea. Este pareamento foi rompido quando Alex foi submetido a diversas ocasiões de violência ao sair da prisão. Quando, por exemplo, os antigos amigos de gangue que se tornaram policiais o agrediram, ou quando foi obrigado a ouvir a nona sinfonia de Beethoven na casa do escritor que ele agredira no início do filme. A nona sinfonia de Beethoven também adquirira a função de estímulo condicionado quando no experimento foi tocada como a música de fundo enquanto Alex assistia às cenas de violência.

Não suportando os efeitos provocados pela nona sinfonia de Beethoven, Alex se joga do terraço do quarto em que se encontrava. Depois disso vai parar num hospital todo quebrado. Enquanto jazia em uma cama de hospital, um médico e uma enfermeira tinham relações sexuais em uma cama ao lado. Em todas estas situações Alex vai sendo exposto a cenas de violência sem que elas fossem pareadas com o estímulo incondicionado. Por isso perdem sua função de eliciarem as respostas reflexas de náusea. O filme termina com Alex imaginando uma cena de sexo selvagem, o que demonstra que se engajar em atos de violência não mais funciona como estímulo condicionado para eliciar respostas reflexas de náusea e também como fonte geradora de punição.

Portanto, o tratamento ao qual Alex foi submetido revelou-se um fracasso total. Também pudera, pois além de coercitivo foi desprovido da realização de qualquer análise funcional dos comportamentos de se engajar em violência. Sem uma uma boa análise funcional qualquer procedimento utilizado para modificar quaisquer comportamentos tem uma grande chance de ser ineficaz.

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sexta-feira, 4 de janeiro de 2013

A Difícil Tarefa de Falar de Sentimentos

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Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Você já percebeu que falar de sentimentos e emoções não é uma tarefa muito fácil? Nós psicólogos vivenciamos isso todos os dias na clínica. Muitos dos nossos clientes querem falar de seus sentimentos, mas as palavras parecem escapar-lhes, e quando alguma palavra é encontrada ela parece não descrever com exatidão aquilo que se sente. No entanto, não é um "privilégio" dos psicólogos poder observar de perto a dificuldade que a maior parte das pessoas têm de falar de seus sentimentos. Aliás, é bom que se diga que os profissionais da psicologia não estão isentos desta dificuldade, afinal de contas nós também somos humanos, e como o resto da humanidade aprendemos a falar de nossos sentimentos com quem não tem acesso ao que estamos sentindo.

Já assinalamos em outros textos que emoções são comportamentos.Tenha acesso a alguns destes textos clicando aqui. O behaviorista não atribui às emoções nenhum status especial. Ele não considera as emoções como os fatores causais daquilo que fazemos. Tanto o que sentimos quanto o que fazemos são comportamentos selecionados (modelados) pelas contingências de reforço que fomos sendo expostos ao longo da vida. Isso não quer dizer que as contingências filogenéticas, aquelas relacionadas à sobrevivência da espécie humana e as contingências culturais não tenham um papel na causação do comportamento emocional.

As contingências filogenéticas selecionaram os comportamentos respondentes que são eliciados quando nos emocionamos. Quando alguém, por exemplo, diz sentir ansiedade, na verdade está relatando algumas transformações fisiológicas que estão se processando no organismo: taquicardia, respiração ofegante, queimação no estômago ou ânsia de vômito, tensão muscular, etc. Estas transformações fisiológicas são os respondentes eliciados quando se sente ansiedade. Isso é apenas parte do comportamento emocional de se sentir ansioso. Outra parte se manifesta através de comportamentos operantes: agitação, fala acelerada, dificuldade de concentração, impaciência, etc.

As transformações fisiológicas foram selecionadas ao longo da evolução das espécies por causa do seu valor de sobrevivência. Imaginemos o caso da ansiedade. Taquicardia e respiração ofegante, por exemplo, ajudam o organismo a entrar num estado de alerta que o prepara para a fuga e contra-ataque. Nos primódios da civilazação humana o Homem disputava alimentos e abrigo com outras espécies, fugir e contra-atacar foram respostas adaptativas selecionadas por contngências filogenéticas. O problema do mundo moderno é que qualquer sinal insignificante de perigo é interpretado como motivo para fugir e contra-atacar, e isso explica porque tantas pessoas têm problemas relacionados com a ansiedade e porque muitas outras vivem explodindo e contra-atacando aquilo que se considera um objeto de temor.

Mesmo os comportamentos de contra-atacar e fugir não são puramente filogenéticos. Há neles um componente operante. Se o contra-ataque minimiza ou elimina os sinais de perigo, acaba por se estabelecer uma contingência de reforçamento negativo. Se a fuga evita danos à integridade física, também se estabelece uma contingência de reforçamento negativo. Mas as respostas de aceleração cardíaca, respiração ofegante, entre outras são puramente filogenéticas, cuja função é colocar o organismo em condições para fuga ou contra-ataque. Neste sentido, podemos dizer que ansiedade enquanto comportamento emocional é um comportamento adaptativo, pois ajudou o homem na luta por alimentos e abrigo.

Mas se a ansiedade como qualquer outro comportamento emocional pode ser um comportamento adaptativo, por que temos padrões emocionais que acabam produzindo problemas, que acabam colocando a integridade do organismo em risco? A resposta está nas contingências de reforço. Se alguém é muito ansioso, pode ser que tenha tido uma história repleta de muitas punições. Sendo assim, vários foram os estímulos que se associaram às punições e por isso se tornaram estímulos aversivos. Então, a pessoa age como se tudo fosse aversivo, como se estivesse prestes a ser punida, por isso precisa manter-se alerta. Uma generalização de estímulos é responsável por este estado de prontidão.

As contingências culturais também têm um papel na causação do comportamento emocional. É dito, por exemplo, que os brasileiros são bastantes expressivos, enquanto que os ingleses são mais frios e introspectivos. Se analisarmos a cultura brasileira encontraremos contingências que favorecem a extroversão, enquanto na Inglaterra encontraremos outras contingências completamente diferentes. Uma análise completa dos comportamentos emocionais também deve levar em consideração estas contingências. Um psicoterapeuta brasileiro atendendo um inglês deve ter o cuidado de não forçar a ocorrência de certos comportamentos emocionais, caso contrário pode criar contingências de controle aversivo que levem o cliente a fugir do tratamento.

Até aqui aprendemos que emoções são comportamentos. Por trás da causação dos comportamentos emocionais estão contingências filogenéticas, contingências de reforço (ontogenéticas) e contingências que envolvem o processo de transmissão da cultura. Resta responder a seguinte pergunta: por que é tão difícil falar de emoções? Lembremos que parte do que ocorre enquanto nos emocionamos são comportamentos respondentes (mudanças fisiológicas). Boa parte destes mudanças geram transformações no interior do organismo, geram estímulos interoceptivos, estímulos que ocorrem no interior do organismo, estímulos que correspondem exatamente aquilo que sentimos quando nos emocionamos.

Estes estímulos são privados, pois só quem tem acesso a eles é aquele que se emociona. Quando descrevemos que estamos sentindo determinada emoção, estamos na verdade descrevendo a ocorrência destes estímulos gerados por comportamentos respondentes. A questão é que aprendemos a descrever tais estímulos, ou descrever nossos estados emocionais com quem  não tem acesso ao que estamos sentindo. Chamamos de comunidade verbal aqueles que nos ensinam tal tarefa. A comunidade verbal é formada por todos os membros que fazem parte dos grupos aos quais frequentamos ao longo da vida: família, escola, grupos sociais, etc.

Se a comunidade verbal não tem acesso ao que sentimos, como ela nos ensina a falar de nossas emoções? Ela faz isso com base em eventos públicos que acompanham nossos estados emocionais. Vamos a um exemplo. Imagine uma criança que ao aprender a dar os seus primeiros passos acaba caindo e ferindo a boca. Imediatamente ela começa a chorar. A mãe presume que ela está sentindo dor e começa a dizer: "oh dó, está doendo bebê? Machucou a boquinha? Fez dodói?" Assim a criança aprende que aquilo que está sendo sentido se chama dor.

Mas não é em todos os estados emocionais que há um evento púbico claro acompanhando um estímulo privado que se presume estar ocorrendo. A comunidade verbal vai sempre inferir a presença de um estímulo privado a partir de eventos públicos correlatos, mas estes últimos nem sempre são assim tão evidentes. Deste fato deriva-se a dificuldade que geralmente temos em falar de emoções, pois aprendemos a relatá-las de modo bastante impreciso, e toda imprecisão decorre do acesso que a comunidade não tem aos estímulos que se originam da ocorrência de comportamentos respondentes.


Este é um dos principais motivos que explicam a dificuldade que todos temos em falar de emoções. Há outros. Emoções que geram estimulação aversiva também vão ser relatadas com dificuldades, pois os estímulos aversivos irão gerar comportamentos que concorrerão com o comportamento de relatar a emoção sentida. Pessoas com pouco treino em habilidades sociais também podem sentir muita dificuldade ao falar de emoções, pois o falar pressupõe um ouvinte (plateia), e a ausência de comportamentos que permitam a socialização transforma as situações sociais em fontes de estímulos aversivos.

Portanto, antes de julgarmos alguém, é bom que nos questionemos se estamos em condições de descrever o que a pessoa está sentindo. Nem sempre os eventos públicos que acompanham os comportamentos emocionais são pistas confiáveis para aquilo que as pessoas estão sentindo. Ao lembrarmos disso evitamos os riscos de chegarmos a conclusões precipitadas a respeito daquilo que as pessoas sentem.

E você, o que achou deste texto? Manifeste sua opinião.

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sexta-feira, 9 de março de 2012

Garçonetes de uma cafeteria nos EUA usam lingerie para aumentar as vendas: conversando sobre emoções

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Você já foi em uma cafeteria, restaurante ou lanchonete em que as garçonetes usassem lingerie? Provavelmente não. Mas pasmem, este tipo de estabelecimento existe. No estado da Flórida nos EUA um grupo de garçonetes resolveu usar lingeries para aumentar as vendas entre o público masculino (clique para ler a reportagem). A questão é que provavelmente esta estratégia apelativa vá funcionar como tem funcionado na mídia há bastante tempo.


É comum vermos, por exemplo, em propagandas de cervejas mulheres sensuais usando biquinis ou outro tipo de peça íntima.


Há alguns anos atrás algo parecido ocorria em propagandas de cigarros. Não acontece mais porque a legislação que regula a venda de tabaco tem proibido esse tipo de estratégia de marketing. Mas por que este tipo de estratégia geralmente funciona?


Há quem diga que estas estratégias funcionam porque provocam certas emoções que levam a pessoa ao uso do protudo que está sendo vendido. Mas não são as emoções as responsáveis pelo comportamento de comprar. Então esta é uma boa oportunidade para explanarmos sobre como de modo geral as emoções são entendidas pelo Behaviorismo Radical.

Primeira coisa a ser entendida: emoções são comportamentos. Isso mesmo, emoções são comportamentos. Geralmente estamos acostumados a pensar as emoções como a força motriz que nos impulsiona a nos comportarmos desta ou daquela forma. Pensamos assim porque o que sentimos ocorre pouco antes de nos comportarmos ou mesmo durante o momento que estamos nos comportando, e como em nossa civilização ocidental fomos educados para entender que causa é todo evento que antecede e provoca um determinado efeito, acabamos por tomar as emoções como causa do comportamento.

Não só estamos acostumados a tomar as emoções como causa do comportamento, como também estamos acostumados a entendê-las como estados mentais. Já vimos em outros posts a posição do Behaviorismo Radical com relação ao mentalismo. O Behaviorismo Radical rejeita toda forma de explicação mentalista do comportamento porque este tipo de explicação geralmente são ficções explanatórias, ou seja, são invenções conceituais que ao invés de explicarem precisam ser explicadas.

Muito embora o Behaviorismo Radical rejeite toda forma de mentalismo, ele não exclui dos estudos da psicologia os eventos privados. Como já tivemos oportunidade de mostrar em outro post a subjetividade encontra no Behaviorismo Radical um lugar de estudos, mas não como sinônimo de vida mental.

As emoções são exemplos de eventos que normalmente chamamos de subjetivos. Por subjetivo geralmente se entende algo que é interno e intrínseco ao indivíduo que se comporta. A dicotomia dentro/fora do sujeito não transforma  um evento em algo especial regido por leis comportamentais diferentes daquelas que regem os eventos públicos.

Os eventos privados - e privado é tudo que não é público e diretamente acessível - não são regidos por leis que sejam diferentes dos eventos públicos. Os eventos privados também são eventos comportamentais, portanto devem ser entendidos a partir das contingências de reforço do qual fazem parte. A questão é que a acessibilidade a estes eventos tornam as contingências responsáveis por sua ocorrência mais difíceis de serem estudadas. E esta é a razão porque se inventam tantas explicações fictícias que apelam para a existência de eventos e estados mentais.

Parte do ato de emocionar-se ocorre de modo privado. Por isso é tão difícil falar de emoções. É difícil falar de emoções porque aprendemos a falar de nossos estados emocionais com quem não tem acesso diretamente a estes estados. Aprendemos a falar do nosso mundo privado, ou seja, aprendemos a nomear os eventos privados - e as emoções são exemplos de eventos privados - com a comunidade verbal em que estamos inseridos. Entendam comunidade verbal como os outros que fazem parte do mundo em que vivemos.

A questão é que a comunidade verbal não tem acesso aos eventos privados que ela nos ensina a relatar. Por isso todos os termos que geralmente se referem às emoções são geralmente imprecisos, pois a descrição dos eventos privados é também imprecisa na medida em que é aprendida com quem não tem acesso a eles. Imagine uma criança que ao dar seus primeiros passos cai e machuca. Ao cair ela começa a chorar. Então um dos pais (comunidade verbal) pega no colo e diz: "coitadinho(a) fez dodói". A comunidade verbal inferiu a existência de um evento privado (dor) a partir da ocorrência de um evento público (cair). Assim vamos aprendendo a nomear nossos eventos privados, inclusive as emoções.

Mas no exemplo da criança tanto a dor (evento privado) quanto o  comportamento de chorar foram provocados pelo mesmo evento: a queda. Logicamente que com isso a criança aprende alguma coisa: ao cair ela pode contar com o amparo dos pais, sobretudo pode chamar a atenção destes. Ou seja, o comportamento de chorar pode ser selecionado por esta contingência de reforço. E este comportamento pode se generalizar, e em outras ocasiões a criança pode fazer algo errado ou simular que se machucou para obter a atenção dos pais. Logicamente que os pais irão discriminar quando é simulação ou não, e colocarão em extinção o comportamento de simular.

Opa, apareceu um novo conceito que ainda não conhecíamos: extinção. No comportamento operante a extinção diz respeito ao processo de enfraquecimento de um comportamento pela remoção dos estímulos reforçadores. Deixando de apresentar os reforços para o comportamento de simular, logo este comportamento se enfraquecerá e desaparecerá. Mas antes de desaparecer provavelmente ele será emitido muitas vezes, e diversas vezes quando for emitido certamente será acompanhado de birras e choro.


Se o comportamento de simular foi reforçado muitas vezes no passado, mais intesas serão as birras e choros. Estas reações emocionais de birra e choro são consequências da operação de suspenção do reforçamento positivo. Vamos a outro exemplo. Quando alguém que gostamos morre ou vai embora para longe, nos sentimos tristes e as vezes choramos. Mas choramos e nos sentimos tristes pelos mesmos motivos, ou seja, por causa que a partida da pessoa levará a suspensão dos reforços que só ela é capaz de apresentar. Não é a tristeza que provoca o choro. Choro e tristeza são provocados pela contingência de reforço que envolve a partida da pessoa que gostamos.


Então emoções são produtos das contingências de reforço ao qual somos expostos. Neste sentido elas são comportamentos, pois são modeladas pela exposição às contingências. Como comportamentos as emoções se manifestam tanto por meio de modificações que ocorrem em nosso corpo (comportamentos respondentes) quanto por disposições que sentimos ao nos emocionarmos.

Votemos às garçonetes e musas das propagandas de cervejas. Alguém que for à cafeteria tomar café poderá desfrutar do prazer de ver mulheres bonitas usando lingeries. Mulheres usando lingeries são estímulos discriminativos que sinalizam a possibilidade de obtenção de prazer via comportamento de observação.  Enquanto tomam café os homens sentem prazer por observarem as garotas com lingerie, sendo assim torna-se mais provável que voltem à cafeteria, e também é provável que o comportamento de beber café se torne um hábito ainda mais prazeroso.

Por associação do reforço "garotas de lingerie" com o comportamento de beber café, pode ser que o beber café naquela cafeteria se torne mais provável. Se o efeito desta associação se generalizar, provavelmente estes homens passarão a beber mais café e todas as vezes que o fizerem sentirão um prazer a mais sem se darem conta disso. Há dois componentes neste comportamento de ir à cafeteria para beber café ou mesmo no comportamento de beber café que se generalizou para outros ambientes. Há o prazer que pode se manifestar via excitação sexual. Claramente trata-se de um comportamento respondente. Há ainda a disposição para beber mais café na cafeteria ou em outros ambientes por causa do prazer associado ao beber. Esta disposição é comportamento operante selecionado pelas consequências associadas ao ato de beber café. O mesmo princípio está embutido nas propagandas de cervejas.

Mais um exemplo para que fique tudo claro. Imagine alguém com raiva. Uma pessoa com raiva ao mesmo tempo sente seu estômago queimando, seu rosto ardendo, seu coração acelerado e seus membros inferiores tremendo. Estômago queimando, rosto ardendo, coração acelerado e membros inferiores tremendo são exemplos de modificações no organismo, são exemplos de comportamentos respondentes. Certamente, por causa destas modificações que sentiu em seu corpo a pessoa dirá que está com raiva, pois outras vezes que sentiu a mesma coisa no passado, a comunidade verbal ensinou-a a descrever estes comportamentos respondentes (modificações fisiológicas) como algo que pode ser chamado de raiva.



Mas ao mesmo tempo a pessoa com raiva sente uma disposição de atacar a fonte provocadora deste sentimento. Esta disposição é comportamento operante. Talvez no passado quando a fonte da raiva foi atacada, o sentimento foi cessado, por isso no presente volta a sentir a mesma disposição. Neste caso contingências do passado modelaram esta disposição. Se atacar a fonte da raiva não for possível, a pessoa pode atacar um outro objeto. Muitas pessoas que sofrem contrariedades no trabalho e não podem revidar por receio de perder o emprego, ao chegarem em casa maltratam os familiares, neste caso se os familiares revidarem nenhum mal mais grave acontecerá, pelos menos é o que se presume.

Portanto, na estratégia de marketing das garçonetes e das propagandas de cervejas estão embutidos os princípios do condicionamento respondente e operante. Tais princípios geram certas disposições emocionais. Mas não são as emoções que levam a maior ingestão de café ou cerveja. Tanto as emoções quanto o ato de ingerir estas bebidas são produtos das contingências que os selecionaram. Sendo assim, fica claro que há um lugar para as emoções no Behaviorismo Radical, mas estas são comportamentos como  quaisquer outros, e só serão entendidas se forem analisadas à luz das contingências de reforço responsáveis por sua seleção.

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terça-feira, 7 de fevereiro de 2012

O condicionamento respondente: definição e aplicações

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Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

No post de apresentação do behaviorismo falamos da existência de dois tipos de classes de comportamentos: respondentes, também chamados de reflexos, e operantes. Nos debruçaremos nest post sobre o comportamento respondente. Mas antes vejamos um vídeo bastante ilustrativo. Trata-se de um vídeo que conta a história de como esta classe de comportamentos foi descoberta.

Ivan Petrovich Pavlov é o cientista responsável pela descoberta da classe de comportamentos que chamamos de reflexos. Eis uma descrição suscinta do experimento que levou a descoberta desta classe de comportamentos. A um cão privado de alimentos foi apresentado uma porção de comida. Observou-se que após a apresentação da comida o cão salivou. Acrescentou-se à situação experimental um novo estímulo. Junto com a apresentação da comida tocou-se uma campainha. Depois de seguidas apresentações da comida acompanhada do som da campainha, notou-se que o som passou a provocar a resposta de salivação. No instante 1:14 do filme é dito que o cão de Pavlov aprendeu a antecipar a comida. Supõe-se algum tipo de faculdade mental que permitiu a atencipação da comida. Mas não foi bem isso que aconteceu. O que ocorreu é que outros estímulos da situação experimental, que se associaram ao estímulo comida, passaram adquirir a função de provocar a resposta reflexa de salivação. Pavlov testou este princípio associando o som com a apresentação da comida. Chamamos de condicionamento respondente (reflexo) o processo através do qual um outro estímulo que a princípio era neutro, passa a adquirir a função de eliciar (provocar) uma resposta reflexa. Este estímulo só adquire tal função porque foi associado a um estímulo que tem a função inata de provocar uma resposta reflexa. Chamamos de estímulo incondicionado o estímulo que tem a função inata de provocar uma resposta reflexa. O termo incondicionado faz referência ao fato de que este estímulo provoca uma resposta sem nenhuma necessidade de aprendizagem, ou seja, faz parte da dotação genética do organismo apresentar certas respostas diante de certas modificações no ambiente (estímulos). Por isso muitas vezes as respostas reflexas são chamadas de instintivas, embora o termo instinto faz supor a existência de alguma força oculta capaz de provocar tais respostas.

Não se trata de nenhuma força oculta ou um ellan vital, mas apenas de respostas que foram selecionadas ao longo da evolução das espécies por causa de seu valor de sobrevivência para a espécie. Assim como a evolução selecionou traços anatômicos e morfológicos, ela também foi responsável pela seleção de comportamentos que fossem capazes de aumentarem as chances de sobrevivência da espécie. Da mesma forma a seleção natural selecionou a susceptibilidade de certos comportamentos serem afetados pelas consequências que produzem, comportamentos que chamamos de Operantes. Mas esta é uma outra história a ser abordada em outros posts. Nos interessa no momento a análise da classe de comportamentos que chamamos respondentes. Voltemos então ao que nos interessa.

No instante 2:01 é dito que o cão aprendeu relacionar (associar) o som com a apresentação da comida. Se há alguma associação é aquela que se dá entre o estímulo comida e o estímulo som, e esta associação não se dá dentro do cão em algum tipo de instância mental rudimentar, mas fora do organismo. Se o estímulo que tem a função inata de provocar uma resposta reflexa - uma resposta selecionada pela seleção natural - chamamos de incondicionado, o outro que a ele é associado e passa a adquirir a mesma função é chamado de condicionado. No experimento de pavlov a comida é o estímulo incondicionado enquanto o som é o estímulo condicionado.

A resposta provocada pelo estímulo incondicionado chamamos de resposa reflexa incondicionada. Já a resposta reflexa provocada por um estímulo condicionado chamamos de resposta reflexa condicionada. Em seu experimento Pavlov descobriu dois outros princípios: generalização e extinção.

Uma vez estabelecido o condicionamento de uma resposta reflexa, qualquer estímulo que se assemelhe ao estímulo condicionado é capaz de provocar a resposta reflexa condicionada. Pavlov testou este princípio apresentando sons semelhantes ao som que originalmente foi associado ao estímulo incondicionado (comida). Todos estes sons também foram capazes de provocar a resposta de salivação. Este princípio é chamado de Generalização de Estímulos.

Já o princípio de extinção diz respeito ao enfraquecimento da resposta reflexa condicionada até que esta desapareça. Isso é feito rompendo-se a associação entre estímulo incondicionado e condicionado. Se o estímulo condicionado é apresentado sozinho, com o tempo acaba perdendo sua função de provocar a resposta reflexa condicionada. Ele pode readquirir esta função, desde que, seja novamente associado ao estímulo incondicionado. Pavlov testou este princípio apresentando somente o som, que com o tempo deixou de provocar a resposta de salivação.

Os princípios do condicionamento respondente podem ser aplicados a uma infinitude de situações para explicar o nosso agir, principalmente podem ser aplicados para explicarem nossas reações emocionais, pois parte daquilo que sentimos e expressamos quando nos emocionamos são respostas reflexas. O parceiro que se excita quando vê a lingerie da parceira é um bom exemplo de uma resposta reflexa condicionada. A visão da lingerie foi diversas vezes associada às carícias recebidas durante os momentos de intimidade sexual. Desta associação a lingerie passou a adquirir a função de provocar a resposta de excitação sexual. Está aqui parte da explicação para a formação dos fetiches.

Quando dizemos que nosso estômago embrulha quando estamos na presença de uma certa pessoa, estamos relatando uma resposta reflexa condicionada. Certamente vivenciamos episódios desagradáveis na companhia desta pessoa, ou mesmo ouvimos diversas pessoas falando mal dela, por isso em sua presença nos sentimos nauseados. A pessoa enquanto estímulo se associou aos efeitos dos episódios desagradáveis vividos em sua companhia.

Parte do que acontece nas reações fóbicas são exemplos de repostas reflexas condicionadas. Alguém que um dia tenha presenciado um acidente de automóvel pode sentir-se angustiado, ansioso e nauseado quando entra em um carro. Poderíamos aumentar infinitamente nossa lista de exemplos, mas estes são suficientes para fornecer-nos uma noção da importância desta classe de comportamentos conhecidos como Comportamentos Respondentes (Reflexos).

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