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segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

As Bromélias e a Teia de Aranha

Por: Hélio José Guilhardi e Patrícia B. P. de S. Queiroz.

- Quanta bromélia junta! Formam um canteiro natural sobre a rocha.
- Olhe essa teia de aranha entre as folhas...
- Nem a tinha notado... Interessante: olhei e não a vi... Faltou alguma contingência para me fazer vê-la.
- Minha frase criou a contingência. Agora você a vê.
- Assim, no dia a dia, fica claro como o comportamento - de ver no caso - é controlado.
- Os cognitivistas diriam que você não “prestou atenção”, por isso não viu a teia.
- Nesse caso, “prestar atenção” antecederia ver? Seria um pré-requisito?
- Para os cognitivistas sim. No entanto, “prestar atenção” não é causa de ver. As contingências me levam a notar aspectos do meio, a “prestar atenção” em detalhes como a teia. Nesse sentido “prestar atenção”, definida como olhar para algo (teia) e nomeá-lo (“teia de aranha”) é comportamento.
- Mas, então, qual foi a contingência para eu ter notado as bromélias já que ninguém “chamou minha atenção” para eu vê-las?
- Neste caso, a contingência está na sua história de vida. Em algum momento, alguém lhe mostrou uma determinada planta (SD) e lhe disse “Isto é uma bromélia” (SD verbal com função de modelo para nomeação). A partir daí, quando você diante de uma bromélia verbalizou “bromélia” (R verbal), sua comunidade verbal a consequenciou com algum tipo de reforço positivo (“Muito bem”, “Isso mesmo”, “Vê como as bromélias são lindas?”, etc.).
- Mas, se aprendi em casa o que é uma bromélia, como a reconheço nas rochas?
- Se o treino discriminativo foi repetido com diferentes tipos de bromélias, em diferentes circunstâncias, você, provavelmente, formou o “conceito bromélia”. Isto é, passou a ser capaz de dizer “bromélia” para muitos tipos diferentes de plantas,  todas bromélias: generalizou dentro da classe de estímulos (bromélias grandes ou pequenas, floridas ou sem flores, ao vivo ou em fotos, etc.). Simultaneamente, discriminou entre classes de estímulos  (não diz “bromélia” diante de uma avenca, ou de uma samambaia, etc.). Tendo formado o “conceito bromélia”, portanto, você está habilitada a identificá-la (uma vegetal bromélia tem função de SD para você) e a nomeá-la em qualquer ambiente.
- Se esse treino ocorreu no passado, onde ficou armazenado para eu usá-lo no presente?
- A idéia de “armazenamento” é cognitivista. Aquilo que foi aprendido não fica “guardado” em nenhum arquivo psicológico, de onde é retirado quando necessário.
- Mas, eu nem estava pensando em bromélias e quando as vi imediatamente as reconheci.
- O “conceito bromélia” está no organismo. Tudo que é aprendido (passou pela condição indispensável de ter sido exposto a uma contingência de reforçamento) passa a fazer parte do organismo. Assim,  organismo é o conjunto formado pelo equipamento biológico e pelo repertório de comportamentos adquiridos. 
- Entendo. Uma pessoa que nunca aprendeu o que é “bromélia” não poderia nomeá-la, mesmo a tendo diante dos olhos. Não teria pré-requisitos para  vê-la. O que não entendo, então é, o papel dos olhos? Eu não vejo com os meus olhos? 
- É uma questão interessante. A resposta é não. Os olhos, enquanto equipamento biológico, são um pré-requisito para o comportamento de “ver”, mas não bastam para ver. O que faz um organismo ver, através ou com os olhos, são as contingências que produzem uma discriminação visual. 
- Como assim?
- Suponha que você olhe para uma lâmina com sangue através das lentes de um microscópio antes de uma aula prática sobre células sanguíneas. Embora, os diferentes tipos de células sanguíneas estejam lá você não conseguirá distingui-las. Após a aula, em que lhe foram ensinados os conceitos  de eritrócitos, eosinófilos, basófilos, plaquetas, etc. você “verá” os diferentes  tipos de células. Foram as contingências (produzidas pela aula) que lhe ensinaram a ver aquilo que você não via antes de ter os conceitos, embora as células estivessem o tempo todo diante de seus olhos. Assim, são necessários os olhos (parte do organismo) e as contingências ambientais para ocorrer o comportamento de ver.
- Acho que entendi. Preciso pensar mais sobre isso... Mas, se  fui ensinada a ter o “conceito” de “bromélia”, ou seja, se sou, digamos, “um organismo bromeliado”, por que não fico dizendo “bromélia” o tempo todo?
- Porque o “conceito bromélia” está no organismo e também nas contingências ambientais. O “organismo bromeliado”, como você disse (aquele que incorporou o conceito de bromélia em função de sua história de vida) está apto para nomeá-la, mas precisa ser exposto a contingências que  evoquem, num determinado momento ou contexto, a resposta verbal para, de fato, nomeá-la. Assim, poderia ser a visão de uma bromélia (SD), a minha presença (um ouvinte com função de SD e com provável função de Sr) como aconteceu no episódio. Poderia ter sido outra contingência, por exemplo, alguém perguntar “O que é uma bromélia?”, “Quem viu uma bromélia?", etc. 
- Mas, houve um momento no nosso percurso em que sem ter visto nenhuma bromélia eu “pensei” nela.
- Pensou em quê exatamente?
- Pensei que nestas montanhas, bem que poderíamos encontrar bromélias...
- Seu pensamento estava, neste exemplo, sob controle do ambiente físico: um local onde há certa probabilidade de existirem bromélias. (É pouco provável que você pensasse em bromélias no meio do oceano, por ex., exceto sob circunstâncias arbitrárias especiais, como ouvir alguém dizendo “Estou com vontade de comer abacaxi..."). É um exemplo de generalização de estímulos. A probabilidade de pensar em bromélia depende da  força da resposta: contingências sob as quais o comportamento foi instalado e o grau de semelhança entre os estímulos presentes e aqueles sob os quais a resposta foi condicionada.
- Você tem razão... Eu já havia visto bromélias em uma região semelhante a esta numa outra viagem que fiz. Agora, o que me chamou a atenção na sua explicação foi que você tratou o meu pensamento como se fosse um outro comportamento qualquer.
- Exato. Pensar é comportar-se. O pensamento é comportamento, sujeito às mesmas leis que qualquer outro comportamento. Sua única particularidade é o acesso para observá-lo. Como se trata de um comportamento privado, sua observação só é acessível à própria pessoa que se comporta (pensa): você no caso.
- Ainda uma coisa me deixa em dúvida... Quando você me perguntou em que exatamente eu havia pensado, dei-lhe uma resposta, mas não foi tudo. De fato, pensei que queria encontrar uma bromélia mas ,além disso, eu “vi” a bromélia que gostaria de encontrar. Posso até descrevê-la para você. Mas, como posso “ter visto” uma planta, com sua flor vermelha, se ela não estava ali?
- Quando você diz que “viu” alguma coisa, e neste caso você viu uma planta que não estava presente, está se referindo a uma outra classe de comportamentos encobertos, que não exatamente pensar. Usualmente, emprega-se nestes casos o verbo imaginar. Ou seja, você imaginou que estava vendo uma planta (é como se você estivesse vendo uma imagem). A concepção de ver uma imagem é também dualista: é como se existisse um objeto e uma cópia dele e em circunstâncias especiais nós vemos a cópia, a imagem. Um resquício da concepção religiosa de corpo-alma, que por sua vez se baseia na filosofia platônica do mundo das sensações e das idéias...
- Como explicar, então, que eu “vi” a bromélia florida?
- A explicação seria a mesma usada para explicar o comportamento de pensar, como foi feito acima, mas agora aplicado a outra classe de comportamento: “ver na ausência do objeto visto”. Assim, é necessário um SD ambiental, no caso região montanhosa, onde bromélias podem ser encontradas. Uma  história passada em que existiram contingências que lhe ensinaram a discriminar (visualmente) uma bromélia, a ter um conceito visual de bromélia, ou, mais específico ainda, de bromélias com flores vermelhas e ainda lhe ensinaram que bromélias crescem e florescem em regiões montanhosas parecidas com a que você está escalando. Sem essa história de contingências e sem o controle de estímulo ambiental você não “veria” bromélias. A bromélia que você “viu” não está no mundo platônico das idéias, está na relação entre seu organismo e o aspecto funcional do ambiente; está nas contingências passadas e atuais.



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quinta-feira, 24 de janeiro de 2013

Autoestima: uma breve análise comportamental

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Vamos começar pelo desmembramento da palavra: auto + estima. Auto é relativo a si mesmo. Autobiografia, por exemplo, é uma narrativa que conta a história do próprio autor que a escreveu. Estima é o apreço que se tem por alguém. Estima vem do verbo estimar. Estimar significa determinar o valor. Na frase, "os cientistas estimam que o sol ainda brilhará por 5 bilhões de anos", estimar significa calcular, ou seja, os cientistas calculam que o sol ainda vai brilhar durante muito tempo. De estimar vem a palavra estimativa, que é o mesmo que calcular aproximadamente. Quando se faz uma estimativa, na verdade está se calculando aproximadamente o valor de alguma coisa. Então o cálculo dos cientistas são estimativas, pois não podem determinar aproximadamente por quanto tempo o sol vai brilhar.

O que importa é que estimar significa determinar o valor de algo. A todo instante estamos determinando o valor das coisas. Uma pessoa pode ter para nós um valor maior ou menor dependendo do seu comportamento. Se seu comportamento é para mim fonte de reforçamento positivo, certamente essa pessoa terá um grande valor para mim. Valorizamos, por exemplo, os nossos pais, pois apesar de todos os problemas eles nos ajudaram e ajudam em diversas circunstâncias da vida. Sim, há aqueles que por motivos vários não valorizam seus pais, e isso é explicável pela história de reforçamento, pela história que está por trás deste relacionamento estabelecido entre filhos e progenitores.

Se por outro lado, o comportamento de uma determinada pessoa é para mim fonte de controle aversivo, esta pessoa terá então um valor menor ou nenhum valor, ou seja, minha estima por ela será muito pequena, meu sentimento de afeição por ela será bem diminuto. Como sentimento é comportamento, com pouca frequência demonstrarei minha afeição por esta pessoa, e se o fizer este comportamento não será assim tão intenso como seria com outra pessoa que tenho muita estima. Se assim o fizer a topografia (aparência/forma) do meu comportamento não demonstrará que meu afeto é assim tão intenso. Para entender porque sentimento é comportamento, leia outros posts em que esta questão é desenvolvida, para isso clique aqui.

Então, o leitor já deve ter percebido que o comportamento de estimar está relacionado com aquilo que sinto com relação às pessoas com quem me relaciono. Tem também relação com a forma como percebo as pessoas. Tanto o sentir quanto o perceber, que são comportamentos, são determinados pelas contingências de reforço que se fazem presente nos relacionamentos estabelecidos com as pessoas. Ou seja, o que sinto com relação a uma pessoa é determinado pelos efeitos dos comportamentos dela sobre os meus comportamentos.

Se os efeitos são agradáveis tomo essa pessoa como alguém agradável. Descrevo minha relação com ela como sendo uma relação agradável. Essa descrição é uma regra. Regras são descrições de contingências de reforço, descrições que fazem relação do "se" com o "então". "Se" eu fizer isso "então" acontece aquilo. Se eu me aproximar de "fulano" ele vai me tratar bem, então vou me sentir realizado. Consequentemente criarei circunstâncias que favoreçam o encontro com esse "fulano". Aqui temos a explicação para o comportamento de perceber.

As chamadas "representações mentais" que se formam a partir da percepção, são na verdade regras que descrevem relações do tipo "se"/"então". Não há representações mentais e nem há um processo chamado percepção que aglutina dados sensoriais e forma imagens na mente. Perceber algo é reagir a uma dada circunstância em função dos estímulos presentes nesta circunstância e das consequências gerados pelo nosso comportar-se. Se diz que o artista tem uma percepção mais refinada para arte do que o leigo. O artista tem uma história de reforçamento que modelou comportamentos de discriminar com maior precisão artes deste ou daquele profissional. Ele estudou, se informou, pesquisou, dedicou sua vida às artes, e nada mais natural que reaja a uma tela num museu de uma forma diferente da forma como reagiria o leigo.

O artista seria capaz de dizer que tinta foi usada na tela, quando ela foi pintada e a qual escola artística ela pertence, pois tem em seu repertório comportamentos que o leigo não tem. Não é sua percepção que é diferente, mas sim seu repertório de comportamentos. Sua percepção não tem nada de diferente. Ele simplesmente reage às circunstâncias, às contingências de reforço, pois tem em seu repertório os comportamentos apropriados para reagir de uma forma diferente da forma como reagiria uma pessoa leiga.

Agora aplique tudo que leu acima em si mesmo. Aplicando você entenderá que autoestima é nada mais nada menos do que o comportamento de estimar o próprio valor. Sua autoestima será elevada dependo da forma como se sente com relação a si mesmo e dependendo da forma como se percebe, ou seja, dependendo da forma como descreve a si mesmo. Mas o que sentimentos com relação a nós mesmos e a forma como nos descrevemos é fruto de nossa história.

Alguns aprenderam ao longo da vida que não têm valor nenhum, pois tendo sido mal avaliados por outras pessoas, tomaram a descrição destas como sendo verdadeiras, ou seja, utilizaram estas descrições como regras para descreverem a própria vida. A questão é que estas descrições podem estar erradas. Quando estão erradas geram autoavaliações disfuncionais. Por sua vez, estas avaliações disfuncionais criam circunstâncias aversivas que fazem as pessoas se sentirem mal. Quando se sentem mal dizem que têm uma baixa autoestima. Como mudar este sentimento? Mudando as contingências de reforço.

Uma terapia pode ajudar a pessoa a mudar as contingências que determinam o comportamento de se avaliar de forma tão negativa. O que importa é a pessoa saber o quanto a sua autoavaliação a incomoda. Se houver incômodos é hora de procurar ajuda, pois este incômodo pode gerar interferências em outros comportamentos, tornando, desta forma, a vida menos produtiva. Uma vida menos produtiva pode se tornar escassa em reforçamento positivo. Por sua vez a escassez de reforçamento positivo pode gerar uma série de outros problemas comportamentais (emocionais).

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