segunda-feira, 28 de janeiro de 2013

Redes Sociais e Correntes de Ajuda: uma análise comportamental

Por: Bruno Alvarenga Ribeiro.

Fala sério, não tem nada mais entendiante do que ter que tolerar aquelas correntes de ajuda que as pessoas compartilham via redes sociais. Digo entendiante para não ter que usar outro adjetivo que possa fazer com que meus leitores sintam-se insultados, afinal de contas eles merecem todo o meu respeito. A moda agora é acreditar que o facebook vai doar uma quantia em dinheiro para o compartilhamento de certas imagens, e é bom que se ressalte que em sua maioria são imagens muito grotescas: crianças doentes, pessoas em situação de calamidade social, entre outras.

Agora tem também a modinha do "sou defensor" dos direitos dos animais. Aí os defensores dos pobres animais para demonstrarem seu "espírito de solidariedade", compartilham imagens que prometem alguns poucos centavos para entidades que defendem estas criaturas. As consequências destas correntes são diversas. Há quem critique abertamente, há quem saia compartilhando, há quem envie indiretas etc. A questão é que de uma forma ou de outra as correntes acabam se proliferando.

Quetiona-se: que contingências estão por trás da manutenção destes comportamentos? Hipótese número um: o que importa é a aparência e não a ação. O fenômeno internet no Brasil é algo bastante recente. É algo que começou a ganhar volume em meados da década de 1990. As pessoas não foram educadas para saberem utilizar os meios de comunicação criados com a internet. Por conseguinte, não estavam preparadas para lidarem com a visibilidade proporcionada por estes meios de comunicação.

E não se pode negar o quanto estes meios de comunicação proporcionam visibilidade, o quanto têm o poder de tornarem público aquilo que é da esfera privada. E quando o privado é tornado público muito ibope acaba sendo gerado, ou seja, muito reforço positivo acaba sendo produzido. Na vida real não importa se a pessoa realiza caridade, se ela se compromete com as causas alheias, se acolhe animaizinhos que precisam de ajuda, pois o que faz na vida real não tem tanta visibilidade quanto o que faz na web. Ela não vai ganhar tanto ibope na vida real promovendo a caridade e se engajando em causas alheias. Não vai deixar de ganhar ibope, mas esse não é tão potencializado quanto pode ser via web.

Em função disso muitas pessoas aparentam se importarem na web com certas "causas" que na vida real elas não estão nem ligando. Hummm, a vida real não gera tanto ibope quanto o mundo virtual! Isso é preocupante, pois as contingências criadas pelo mundo virtual podem estar produzindo pessoas que vivam de aparências, que fingem ser algo que não são, que se escondem atrás de um perfil de rede social ou de um nick de uma sala de bate-papo. Portanto, o que acaba importando é a aparência e não a ação!

Hipótese número dois: como as pessoas não foram educadas para um mundo virtual, aliás, elas foram educadas em escolas com quadros negros - que sempre foram verdes - aos frangalhos, em escolas em que faltavam giz e apagador, e professor se virava para conseguir educar, não formaram um repertório de comportamentos que permita entender o mundo da web, principalmente o mundo das redes sociais. Uma pergunta para você: na vida real você fica compartilhando (falando) com seus amigos notícias sobre animaizinhos em situação de perigo, de pessoas em situação de calamidade social, de crianças com câncer que precisam de doações de R$0,05 (cinco centavos) com tanta frequência quanto faz nas redes sociais? Na vida real você acreditaria que cada vez que falasse destes assuntos uma quantia em dinheiro seria doada para um órgão qualquer? Certamente você não age assim e não é tão ingênuo de acreditar que falando destes assuntos algo concreto vai acontecer.

É uma questão de contingências de reforço. Se na vida real você agir como descrito acima, esse comportamento logo será colocado em extinção, pois ninguém vai doar nenhum dinheiro porque você fala de crianças com câncer. Você pode organizar um movimento para conseguir dinheiro para crianças com câncer, mas estaríamos falando de outro repertório de comportamentos que poderia produzir consequências reais. Mas o simples falar não gera doações em dinheiro, certo? Certíssimo, não gera mesmo! Por isso na realidade você não age como na web, pois as contingências são diferentes.

Na web os comportamentos acabam sendo reforçados com a função "curtir" ou "compartilhar" do facebook, e a pessoa pensa assim quando vê todo mundo curtindo e compartilhando: "se todos curtem e compartilham, então, vou fazer também". Surge daí uma regra que não descreve uma contingência real. Lembre-se, regras são descrições de contingências de reforço, descrições que descrevem relações do tipo "se/então". "Se" aperto o botão da tomada, "então" a lâmpada acende. A regra que descreve o comportamento de apertar o botão da tomada, que tem como consequência o acender da lâmpada, é uma regra que descreve uma contingência real, em que o "se" está relacionado com o "então".

Mas na web não é bem assim que acontece. "Eu compartilho esta imagem e a criança com câncer recebe uma doação de cinco centavos". A pessoa não vê a consequência final acontecendo, consequência que reforçaria todo o encadeamento de respostas que produziram o clicar e o compartilhar, pois esta consequência não existe, ela é lenda! Mas o que mantém o comportamento? O curtir de outras pessoas e a regra já descrita: "todo mundo compartilha, então deve ser verdade". O brasileiro não foi devidamente educado para se comportar no mundo virtual, então, falta no seu repertório comportamentos que permitam discriminar como funciona o infinito universo da web.

Enfim, podem existir outras hipóteses explicativas, mas estas que aqui foram levantadas nos dão uma ideia das diferenças existentes entre as contingências de reforço no mundo virtual e no mundo real, e dos tipos de comportamentos que ambas modelam. A questão é: estamos preparados para lidar com os comportamentos que as contingências de reforço do mundo virtual têm modelado?

E você, o que achou do artigo? Deixe seu comentário.

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4 comentários:

  1. Olá Bruno, como vai? :)

    Maravilhoso seu artigo! Assino embaixo das suas colocações e observações :)
    Por trabalhar em um agregador de notícias e ser ativa nas redes sociais, cada vez mais me espanto com a inocência e falta de responsabilidade das pessoas. Parecem viver num mundo à parte quando estão on line...
    Esta questão de correntes etc, vi de perto um ótimo exemplo, na cidade em que eu morava resolveram fazer uma associação para cuidar dos cachorrinhos de rua, no facebook era um estouro, todo mundo postando, se vangloriando, mas na verdade, de centenas de pessoas, apenas 2 ajudavam de fato os bichinhos...
    Esta questão de "todo mundo compartilha então deve ser verdade" acontece demais mesmo! No meu trabalho por exemplo recebo todos os dias reclamações de perfis excluídos, explico o motivo, que às vezes é até mesmo crime virtual e a pessoa diz, ah mas todo mundo estava fazendo, então achei que podia... Quer dizer que se alguém pular da ponte, esta pessoa pula também? Perdeu a noção de certo e errado só porque está na net...
    Creio que estas ferramentas chegaram muito rápido e não temos ainda bom senso, responsabilidade, educação e respeito para usá-las da maneira correta, espero que futuramente, isso mude :)

    Parabéns pelo artigo! Grande abraço e bom restinho de semana :)

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    1. Samanta, muito obrigado pela contribuição. Penso que a origem deste problema esteja relacionado à educação. Não fomos preparados para lidar com estas tecnologias. Estamos pagando as consequências de não termos sido educados para lidar com as possibilidades geradas pela internet. E continuamos a aprender lidar com tais inovações com a prática, pois poucas são as escolas que incorporaram em seu sistema educacional conteúdos que preparem seus alunos para encararem as possibilidades criadas pela massificação da informação. A internet está aí e não tem como voltar atrás. Agora é encará-la e dela extrair o que ela tem de melhor!

      Abraços e bom resto de semana! Fiquei feliz com sua contribuição!

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  2. Essa questão do comportamento virtual é algo que deveria ser mais discutido e esclarecido. Já citei também o quanto é de mau gosto colocarem certas questões na internet, como a exemplo imagens de animais mutilados, com a finalidade de alerta à sociedade quanto à existência dos maus tratos... mas as pessoas esquecem que há um limite, na verdade, na internet não sei bem se chega a ter qualquer limite. Quando aconteceu aquele caso de uma enfermeira que maltratou um cachorrinho, até o endereço e CPF da criatura as pessoas espalharam e divulgaram... aí me pergunto qual a real justiça que se prega por trás de um computador... é muito fácil sair disseminando imagens e informações e achar que está contribuindo ainda para alguma coisa, sem antes refletir sobre as consequências da ação justamente porque uma massa de pessoas está tomando a mesma atitude, ou seja, "só podem estar certas"... Vi casos de postagens de fotos de pessoas com descrições do tipo: "cuidado, esse fulano da foto é um pedófilo" e milhares de compartilhamentos já seguidos de ameaças. Quando isso acontece eu penso: "mas será mesmo que essa informação é verdadeira? Até onde sei, qualquer um poderia pegar uma foto à esmo e editar uma informação falsa e contaminar as redes sociais"... o fato é que as pessoas não checam a veracidade, principalmente quando muitas compartilham a mesma coisa.

    Muito interessante teu texto e o blog, já estou seguindo e passarei a acompanhar. Um abraço!

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  3. A questão foi muito bem apontada por vc Nandarilha. Há um limite para a verdade, principalmente quando se trata do mundo virtual. Penso que o pano de fundo de tudo isso é a educação. Boa parte da população que tem acesso às redes sociais não recebeu uma educação para lidar com essas poderas ferramentas de comunicação. Enquanto esse déficit educacional não for corrigido, esses fenômenos continuarão acontecendo com mta frequência.

    Obrigado por sua contribuição!

    Abraços.

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